Isabella

Edward estava aqui. Edward veio atrás de mim. Edward não tinha as mensagens que enviei no celular. Edward não sabia sobre Chloe. Edward nunca soube sequer que eu estava grávida.

Edward estava aqui. Edward veio atrás de mim. Edward não tinha as mensagens que enviei no celular. Edward não sabia sobre Chloe. Edward nunca soube sequer que eu estava grávida.

Essas palavras se repetiam em looping na minha cabeça enquanto ele estava na minha frente dizendo alguma coisa que não registrei. Seus olhos pareciam torturados, mas meu cérebro não conseguia entender porque estava ocupado tentando manter o resto do meu corpo funcionando para que eu ficasse consciente.

Obviamente, falhamos. Meu estômago estava se contorcendo, mesmo vazio, e eu precisava desesperadamente de ar. Conseguia sentir meus olhos se enchendo de lágrimas, reconhecendo os sinais de uma crise de pânico prestes a começar. Eu havia sido egoísta, tinha me precipitado e tirei da minha filha a chance de ter um pai… Como pude fazer isso com alguém que eu amava tanto?

Se tudo que eu vivi nos últimos anos era uma mentira, o que era verdade? Qual era o ponto aqui?

Edward ainda estava parado na minha frente, em expectativa. Eu o conhecia bem demais para saber que ele queria explicações, mas eu também queria. Essa seria uma conversa difícil, que nunca imaginei que aconteceria no meu escritório no restaurante. Não que essa cidade tivesse muitos lugares para uma conversa a sós, então aqui era o melhor lugar.

— Eu posso ao menos saber o nome dela? Só isso, e vou embora — pediu.

Respirei fundo uma, duas, três vezes, antes de falar novamente. Algo no rosto, na expressão dele, me convenceu que ele devia saber.

— Chloe.

Eu não sabia se ele se lembrava, se teria a referência imediatamente. Chloe era a música que ele cantava para mim, anos atrás. Ela dizia: você pensa que ela tem tudo mas isso não faz dela melhor. Você tem o meu coração e essa é a única coisa que importa. Chloe, você é a única que eu quero. Quando soube que era uma menina, eu achei que me ajudaria a ressignificar aquela canção, já que o amor da minha vida agora era a minha filha. Se ele não lembrasse também não faria muita diferença agora.

Edward se virou para a porta, com um sorriso no rosto. Ele lembrava.

— Espere! - chamei — Fique, por favor.

Eu estava a um passo de jogar tudo para o alto e correr na direção dele, pedindo desculpas pelo que ele quisesse e beijá-lo como se nenhum dia tivesse se passado, mas precisava de foco. Eu não era mais uma adolescente apaixonada pelo cara mais lindo que já havia pisado naquela cidade, agora eu era uma mãe e aquele cara era o pai da minha filha - que tinha acabado de descobrir sobre ela.

Edward voltou e se sentou na cadeira na minha frente, puxando para si o porta retrato que eu tinha afastado. Eu conseguia ver um brilho diferente em seus olhos enquanto ele passava os dedos pela imagem de Chloe na foto. Meu peito se apertou com culpa. Eu tinha tirado isso dele, tirado isso dela.

Me sentei também, de frente para ele. Agora parecia que estávamos em uma reunião de negócios. Formal demais para o momento, mas era o que tínhamos. Por onde começar?

— Imaginei tantas vezes como seria nosso reencontro, mas acho que nunca imaginei este cenário aqui em específico — ele começou, depois de alguns minutos em silêncio.

Eu ri, meio sem humor, porque também tinha feito a mesma coisa. Só que eu era uma romântica incurável, o que me fez imaginar inúmeros cenários diferentes, dos piores aos melhores. Ser assim era às vezes um defeito e às vezes uma benção.

— Você pensou em voltar, em algum momento? Depois de não conseguir me contatar, você pensou em vir até aqui me procurar? — perguntei.

— Sim. Eu queria entrar em um avião no dia seguinte e bater na sua porta, mas não o fiz porque fui covarde demais para enfrentar meu pai. Você tem sorte de nunca tê-lo conhecido, aquele homem era capaz de acabar com a vida de alguém apenas com palavras, e foi o que tentou fazer comigo naquele dia. Ele virou advogado porque manipular as palavras à seu favor era tudo o que ele sabia fazer, no final das contas — ele falou de uma vez — A influência dele sobre mim era tão grande que só consegui sair depois que ele morreu, mesmo com todos ao meu redor me incentivando o tempo todo a viver a minha própria vida, e não a que ele queria que eu vivesse.

As palavras saíram como um desabafo e eu deixei que ele falasse.

— Esme me castigará quando souber disso, mas nunca me senti tão aliviado quanto como no dia em que ele se foi. Toda a educação cristã que ela e Carlisle tentaram me passar foi para o ralo nesse dia, porque eu agradeci a Deus pela morte dele. Eu finalmente estava livre.

O pai era uma influência na vida dele - ainda que negativa, com um exemplo a não ser seguido, desde sempre. Eu me lembrava das histórias que Edward me contava sobre a mãe, e o pai raramente estava presente. Quando estava, nunca era citado como reverência ou, no mínimo, carinho. Eu esperava que ele fosse um pai melhor que o que tivera. Agora eu que estava imaginando cenários.

— Espero que um dia você me perdoe por isso, Bella. Se ao menos eu soubesse… Eu daria qualquer coisa para voltar no tempo — notei que a voz dele estava falhando, quase como se tentasse segurar o choro — Uma filha! Como pude perder isso? Por que nunca pensei que isso pudesse acontecer? Eu nunca suspeitei de nada.

Fui atingida novamente pela culpa, porque essa parte também era minha responsabilidade. Eu tinha proibido que qualquer pessoa citasse o assunto para ele, e isso incluía os tios que possivelmente eram as pessoas em quem ele mais confiava no mundo, e eu quebrei essa confiança. Isso estava se tornando um desastre e ele nem sabia dos detalhes ainda.

— Você não soube porque eu pedi que não contassem, Edward. Você me magoou e essa foi a minha forma de me proteger — foi a primeira vez que olhei em seus olhos e pude confirmar que estavam mesmo cheios de lágrimas — Eu estava com tanto medo que não te falei nem que suspeitava de nada, fiz aquele teste sozinha. E quando você… quer dizer, quando recebi aquela mensagem, eu queria sumir, me esconder em algum lugar com o meu bebê, como se fosse possível protegê-lo de tudo. Não culpe ninguém.

Me culpe, eu queria dizer, mas seria injusto. Pelo menos em relação a isso.

— Você conseguiu? Digo, proteger o bebê? — ele perguntou e eu assenti, meio sem entender — Nós temos uma filha, meu Deus! Por favor, Bella, me conte tudo que perdi.

Ele se aproximou e pegou uma das minhas mãos nas suas, era a primeira vez que nos tocávamos e a mesma corrente elétrica ainda estava presente, quase como um choque. Eu não sabia onde estava com a cabeça agora, mas movi o corpo para mais perto, como se nada tivesse acontecido e fosse um movimento muito natural.

— Ela é linda — falei, baixinho como se fosse um segredo — Tem seus olhos, seu cabelo. É quase como se fosse você em miniatur criança mais linda do mundo todo.

Ele abriu um sorriso que chegava aos olhos - como se para confirmar o que eu disse, e vi duas lágrimas rolarem. Se ele percebeu que eu estava dizendo que ele era lindo, não transpareceu. Eu era patética, uma adolescente patética.

— Não duvido que seja linda, ainda mais sendo sua… Sendo nossa — ele estava maravilhado — Quero saber cada detalhe. Tudo que você quiser me contar.

Em um instante, parecia que todos os meus medos nos últimos anos eram infundados. Se eu tinha receio de aproximar Edward de Chloe, agora eu queria mais que tudo que os dois se conhecessem. Queria recuperar todo o tempo perdido. Queria que ele estivesse lá a todo momento.

Agora eu acreditava que ele não tinha vindo tirá-la de mim, porque ele não sabia sobre ela. Ele nunca tinha perguntado, porque não sabia. Foi um desencontro. Eu acreditei tão facilmente nele, porque eu queria acreditar. Era como se tudo estivesse se encaminhando exatamente para onde deveria ir.

Todavia, a realidade nos chamou de volta muito rapidamente. Uma batida na porta me fez dar um pulo na cadeira.

— Isabella, é melhor que você não esteja aí dentro com ele. Eu juro, por tudo, que se ele estiver a menos de um metro de você, a próxima viagem que ele fará será para o cemitério municipal - a voz vinha de fora como um trovão. Jacob.

Olhei para Edward, meu medo refletia nos olhos dele. Eu queria abrir um buraco no chão e me enfiar lá dentro, qualquer coisa para não ter que lidar com a raiva do meu irmão. Ele não teria a paciência de ouvir antes de agir, como eu fiz.

— Eu sinto muito — sussurrei para Edward, exatamente um segundo antes da porta ser aberta por um Jacob muito, muito raivoso. De alguma forma, o tom da sua pele estava avermelhado e seus braços inteiros tremiam.

A cena seguinte aconteceu como nos filmes, em câmera lenta. Foi como se eu assistisse uma tragédia daquelas bem ruins desenrolar diante dos meus olhos. Em um flash, Jacob se lançou para cima de Edward e os dois caíram no chão. Ouvi o barulho do vidro do porta retrato se partindo, assim como o estrondo dos dois corpos batendo no piso e o meu próprio grito.

— Filho da puta! Você não vai tirá-la de nós — meu irmão estava em cima de Edward, que tentava lutar para não ser atingido pelos socos — Acha que pode chegar aqui e tentar comprar o amor dela? Você é um merda, um lixo de homem. Eu te matarei antes que você encoste em Chloe.

Os dois eram grandes, tinham quase dois metros de altura cada um, mas Jake era muito mais forte, indiscutivelmente. Ele conseguiria me levantar em um só braço sem muito esforço, como já tinha feito antes. Eu gritei novamente quando o vi segurar a cabeça de Edward no lugar e investir mais uma vez o punho na direção dele.

— Pare! Pare com isso agora, Jacob, você vai matá-lo — gritei em desespero.

Finalmente dois funcionários - Embry e Quil - apareceram e puxaram Jake para cima. Ele estava se batendo como um animal tentando se soltar dos braços dos dois e, por mim, poderia ficar lá até esgotar as forças. Eu estava preocupada com o pai da minha filha no chão, com o rosto ensanguentado.

— Edward, me desculpe — eu tentei falar, em meio a uma confusão de lágrimas e soluços, enquanto tateava seu rosto com as mãos, tentando entender se algo estava quebrado.

— Tudo bem, tudo bem — ele respondia, mas o sangue escorrendo da testa e do nariz diziam o contrário. Eu queria apertar o pescoço de Jacob até que ele ficasse sem ar. Imbecil.

Sue entrou no meu escritório e tudo era um grande escarcéu de gritos, choro e raiva explodindo.

— Você perdeu a noção, Jacob? Como pôde fazer isso com o pai da sua sobrinha? Quer que Chloe cresça órfã como você, garoto sem fé? — ela gritou e ele finalmente parou de se bater — Soltem-no. Você vem comigo.

Ela e Jacob saíram e eu não pude sentir um pingo de pena pelo que ela faria com ele. Torcia para que fosse ainda pior que a minha imaginação, inclusive. Ele merecia sofrer um pouco. Eu até iria sugerir que Edward prestasse queixa por isso.

Eu o levei até o bar e enchi duas toalhas com gelo, para tentar amenizar o estrago. Não me importei com os clientes nos olhando, a essa altura, a cidade inteira já devia estar sabendo o que aconteceu ali. Ficaria zero surpresa se uma viatura aparecesse em breve.

— Está tudo certo, Bella. Vou pedir que Carlisle dê uma olhada mais tarde — Edward disse, me devolvendo as toalhas que já estavam encharcadas — Minha preocupação agora é outra. Onde está Chloe no meio dessa confusão toda? Ela viu alguma coisa?

Era errado, mas eu sorri porque ele lembrou dela. Isso era exatamente o que eu tinha desejado por tanto tempo, ter alguém para dividir todas as preocupações da maternidade, alguém que tivesse a mesma responsabilidade que eu, porque queria e não porque eu estava terceirizando as minhas funções. Isso é errado, Isabella.

Deixei Edward no escritório e saí à procura de Chloe pelo restaurante, o furacãozinho não estava em nenhum lugar perto daquela confusão, senão já teria aparecido. A encontrei brincando no espaço infantil, sendo cuidada por Emily, e totalmente alheia ao que tinha acontecido lá atrás. Fiquei no arco da porta observando enquanto ela subia e descia no escorregador, como se fosse uma menina grande, como ela mesma dizia.

Eu queria tanto que ela pudesse ser sempre assim: inocente e feliz. Queria protegê-la de todo o mal do mundo, de todas as decepções, de qualquer coisa que interferisse na sua felicidade.

— Mamãe! — ela gritou quando me viu. Suas pernas gordinhas se agitaram enquanto ela descia no escorregador e vinha na minha direção — Dodói? — perguntou, e aí eu percebi que estava chorando.

Limpei as lágrimas e neguei com a cabeça, ao mesmo tempo que estendi os braços para pegá-la no colo.

— Não, meu amor. Está tudo bem, a mamãe só está feliz por te ver — respondi, ganhando um sorriso enorme de volta.

Essa era a razão de tudo que eu tinha feito até aqui, a minha filha. Seus olhos - iguais aos do pai que me esperava na outra sala - brilhavam ao me ver, seus cachinhos ruivos balançavam, e seu sorriso era o mais lindo do mundo. Era por ela que eu lutava, por ela que eu levantava todos os dias e dava o meu melhor. E, por isso, naquele exato momento, tomei o que poderia ser minha decisão mais importante até ali: eu aceitaria que Edward voltasse à minha vida.

Se ele quisesse ser pai de Chloe, ele seria. A única regra era que ele não poderia machucá-la, sob hipótese alguma. Estava decidido.

A partir daí, as coisas mudariam: eu precisava contar para toda a minha família e amigas mais próximas e sustentar essa decisão. Por fim, precisava entender o impacto que isso teria para a pessoa que mais importava ali: Chloe.

Ela estava habituada a sermos nós duas, mais os membros da nossa pequena família. Era tudo que ela conhecia. Ela ainda era muito jovem para entender a diferença entre ter ou não um pai, mesmo porque havia figuras masculinas presentes. Eu precisaria conversar com Jasper - o noivo de Alice que também era terapeuta.

— Você consegue fazer um favor para a mamãe e ficar mais um pouquinho com a vovó Sue enquanto resolvo um probleminha? — pedi, colocando-a de volta no chão — Emily, você cuida do caixa para mim, por favor?

Chloe era tão especial que apenas concordou e voltou a brincar, sem ter a menor ideia de que sua vida estava prestes a mudar completamente.

Ondas de ansiedade passaram pelo meu corpo enquanto eu voltava para encontrar Edward, mas a decisão estava tomada. A partir do momento em que ele entrou no restaurante, não tinha mais volta.

— O que pensa que está fazendo? — perguntei quando o encontrei caminhando para frente.

— Indo ao hospital checar o meu nariz? — respondeu, mas soou como uma pergunta.

— É óbvio que não, você não pode dirigir assim. Venha, eu te levo até Carlisle.

Era muito estranho estar tão perto dele, ainda mais no meu pequeno carro - um Mini Cooper que comprei usado há algum tempo, mas não era um estranho desconfortável. Eu só torcia para que ele não voltasse a sangrar bem ali, porque o cheiro em um ambiente fechado seria insuportável.

Na minúscula cidade, nós chegamos muito rápido ao hospital. Não pude evitar reparar nos olhares quando o acompanhei para dentro da emergência, muito menos no burburinho quando dei seu nome na recepção. Era óbvio, eu devia ter previsto isso. Quem não tinha nos associado ainda, agora estava em polvorosa porque o sobrinho do chefe estava ali comigo.

Ele pegou na minha mão e me levou consigo quando a enfermeira o conduziu até um leito para limpar seu rosto. Parecia que éramos um casal, mas isso não me incomodou. Foco, Isabella.

— E então, o que temos aqui? — Carlisle entrou na sala e pareceu desconcentrar a enfermeira que passava uma gaze no corte no supercílio de Edward. Ele deu um gemido de dor e apertou a minha mão — Pode deixar que eu sigo daqui, Carmen.

Edward editou a história, sem a parte em que Jacob tinha ameaçado sua vida com palavras, mantendo apenas as agressões físicas. Carlisle balançou a cabeça e riu quando ouviu que ele não reagiu.

— Apesar de todo o sangue, seu nariz não está quebrado. Entretanto, terei que dar pontos aqui na sobrancelha, farei meu melhor para não deixar uma cicatriz — o médico disse, e eu respirei aliviada.

— É uma pena, eu estava ansiosa pela reação de Jacob ao receber a conta do cirurgião plástico — brinquei.

Com Edward devidamente costurado, limpo - com exceção da camisa que estava arruinada agora - e com medicações para dor, nós voltamos ao restaurante para que ele pudesse resgatar seu carro. Eu estava ansiosa novamente.

— Dia agitado, né? — ele disse, quando estávamos na porta — Duas horas atrás eu estava procurando por você e agora sou pai.

— Você já era pai, só não sabia — corrigi, mas não estava de fato chateada.

— Isso é… incrível. Mesmo. Uma grata surpresa, eu diria — pensou por um segundo — Tenho que lembrar de agradecer a Seth, mas não acho que sua casa seja o melhor lugar para mim agora.

Seth? O que ele tinha feito agora?

— Foi ele quem me disse que você estava aqui - disse, e presumi que um grande ponto de interrogação havia se formado na minha testa — Posso fazer um pedido?

— Sim, nós só precisaremos ir lá dentro para lançar no sistema e…

— Não é comida, Bella — me interrompeu. Ah — Você poderia, por favor, desbloquear meu número? Nos falamos depois.

Sem esperar pela minha resposta, ele se aproximou e deu um beijo na minha testa, antes de se virar em direção ao carro. Eu quase me lancei em seus braços bem ali, mas uma voz na minha cabeça gritou que não era a hora. A voz da razão, é claro, porque a da emoção queria que eu fosse com ele e vivesse feliz para sempre.

— Até mais tarde, Edward — eu disse, sem ter certeza se ele ouviu.