A chaleira apitou às oitavas e Hinata quase tropeçou no tapete felpudo da sala quando correu para tirá-la do fogo. O sol ainda não podia ser visto no horizonte, porém ela já estava de pé, ou quase isso. Coçando os olhos e dando um bocejo demorado, Hinata despejou o café fumegante no copo e tampou logo em seguida. Resolveu checar se o bolinho que fizera estava bom dando uma generosa mordida, decidindo por fim devorá-lo por total. A jovem Hyūga estava ansiosa, começaria hoje a missão designada pelo Rokudaime, rezava para que se saísse bem ao menos nisso. Pensar em Sasuke lhe trazia um mar de incertezas, desde criança Hinata sequer teve um diálogo com o Uchiha e agora teria que conviver com o ex-desertor. Ela sabia que Sasuke era uma pessoa difícil de se lidar, mas o compreendia e esperava que o tempo os ajudasse a ter, quem sabe, uma relação pacífica. Mas teria que ir com calma, afinal lidar com o moreno é como andar em um campo minado — essas foram as palavras do grande Uzumaki —, nunca se sabe quando irá explodir a próxima bomba.

No relógio de pulso marcava 5h 50min, as orbes de pérolas se arregalaram e a azulada soltou um palavrão quase inaudível por causa do tempo veloz.

— Que problemático! — pegou rapidamente o café da manhã de boas vindas e se dirigiu para a porta.

Trágico. Trágico. Trágico.

As palavras formavam um nó na cabeça da garota e a enchiam de insegurança. Com certeza o Uchiha assim que a visse, acharia que era incompetente, assim como todos os outros, a olharia de esgelha e...lá se ia ladeira abaixo toda a esperança de uma convivência pacífica.

Bem, era isso que sua cabeça insistia em lhe dizer.


Todo aquele tempo enclausurado naquela cela fétida e mal iluminada parecia ter sido uma eternidade para Sasuke. Agora liberto, ele se sentia vazio, deslocado.

Sem propósito, como todos os outros anos.

A brisa gelada do início da manhã bagunçava os fios negros, desalinhando-os do seu formato original. Estava de pé e ao seu lado Tsumi, um guarda da prisão, não que fosse preciso mas Sasuke achava que ainda não confiavam totalmente nele, talvez tivessem razão.

— O Rokudaime ordenou uma escolta especial para você, Uchiha — o outro soltou sem rodeios, quebrando o silêncio.

— Hm — um som monossilábico escapou de seus lábios. Ele assentiu, esperando pacientemente.

Afinal, o que lhe restava era esperar.

Agora não havia mais uma certeza como a de um lugar na prisão - por pior que isso pudesse parecer -, novamente estaria jogado, esquecido como Eleanor Rigby, a moça dos Beatles. Voltaria para o distrito, mesmo que não houvesse ninguém o esperando.

E então ele sentiu um chakra familiar, agitado. Foi então que viu Hinata vir do Sul, correndo afobada com algumas sacolas na mão. Sua expressão estava retorcida, ele até achou aquilo engraçado, parecia uma criança que foi pega no auge da sua maior travessura. O mais cômico era ver a criatura de um e sessenta correr como se fosse tirar a mãe da forca.

— O-ohayo, Uchiha-san — a coitada mal se aguentava em pé — Mil perdões pelo atraso, eu sei que deveria estar aqui já faz dez minutos, p-prometo que não irá se repetir. — Enquanto Hinata se desculpava pelo atraso, fazendo inúmeras reverências, Sasuke fazia algumas notas mentais sobre a morena: ela era...agridoce.

— Tudo bem — disse.

Ela corou.

E ele achou aquilo extremamente adorável.

— Senhor Tsumi, eu sou o Ninja encarregado de escoltar o senhor Uchiha, a partir de agora ele está em minhas mãos. — inquiriu firme, deixando a timidez de lado. O moreno a olhou de esguelha, preferindo ficar calado.

— Afirmativo — disse o outro guarda. Poderia ser impressão sua, no entanto jurou ter visto um olhar carregado de segundas intenções do guarda para a Hyūga, porém não deu importância.

O último Uchiha voltou sua atenção para a Herdeira dos Hyūgas caminhando ao seu lado, ela tinha pose rígida como a de um general ou talvez aquilo fosse só impressão sua. Até então a ninja não tinha se atrevido a abrir a boca, talvez porque sabia da grande paciência que ele tinha. Os olhos lilases estavam atentos em toda movimentação e, algumas vezes Sasuke sentia seu olhar desconfiado pairar sobre si.

Será que ela tinha medo dele?

Bom, não se surpreenderia caso a resposta fosse sim.

— Está com fome, U-uchiha-san? — contrariando todas as suas hipóteses e questionamentos, Hinata lhe direciona um sorriso miúdo e complacente. É a primeira vez em que ela encara tão profundamente suas orbes ônix.

— Hm, sim. — afirmou sem entusiasmo. A ninja apontou para um banco próximo a eles e Sasuke entendeu o que ela quis dizer.

Quando se sentaram, a Hyūga lhe estendeu a marmita que estava em suas mãos. Então era para ele aquilo tudo…? Deveria agradecer ao menos, mostrar que tinha educação.

Mas era um pouco difícil fazer isso quando estava quase morrendo engasgado com a iguaria.

— U-uchiha-san, gomen! — Hinata deu leves tapinhas nas costas do ex-nukenin, aflita. Mas o fato era que ele conseguido a proeza de se engasgar acidentalmente, e não porque estava ruim ou algo do tipo, só que ela não sabia disso — v-você e-está bem?

Sasuke respirou profundamente.

— Sim — até o próprio estava constrangido, e sem saber como agir. — Não se preocupe.

Hinata arqueou as sobrancelhas para ele.

Seu coração quase saiu pela boca ao vê-lo indo do pálido para o roxo em segundos. Aliviada, a perolada segurou o rosto do moreno entre suas mãos, apertando sem querer suas bochechas.

— Prometo que isso não vai se repetir novamente. Prometo que irei cuidar de você!

Pela primeira em muito tempo, uma garota fez com que Sasuke ficasse mudo.