No mar agitado de East Blue, uma tempestade de raios castigava o oceano sem piedade. Relâmpagos cortavam os céus como lanças de luz, e trovões rugiam como monstros enfurecidos. A bordo de um simples navio de transporte de passageiros, uma figura solitária se mantinha firme na proa, encarando o caos natural com olhos silenciosos.
Envolta em um manto escuro, encharcado pela chuva, estava uma mulher de longos cabelos ruivos, cor de carmesim. Seu rosto permanecia parcialmente oculto — não apenas pela sombra do capuz, mas também pela clara intenção de manter sua identidade em segredo. Mesmo com o vento uivando ao seu redor e a água gelada batendo em seu corpo, ela não parecia se abalar. Cada raio que iluminava o céu refletia em seus olhos como flashes de memórias antigas — lembranças que há muito tempo a atormentavam.
Ela só foi tirada de seus pensamentos quando um dos tripulantes, vestindo uma capa simples de marinheiro, se aproximou com cautela.
— Senhorita, você precisa se abrigar dentro do navio! Está ventando forte, e essa chuva não vai parar tão cedo. Pode acabar ficando doente!
— Não, obrigada. Eu vou ficar bem aqui. Não se preocupe comigo.
O tripulante hesitou, olhando para ela com genuína preocupação.
— Tem certeza?
— Sim... Eu vou ficar bem.
Enquanto dizia isso, sua mão se moveu lentamente para acariciar a barriga. Ainda não havia sinal visível de gravidez, mas dentro dela crescia uma vida — uma promessa. O filho que mudaria tudo.
— Bem... se precisar de qualquer coisa, é só entrar. — disse o marinheiro, antes de se afastar para ajudar os outros passageiros.
Sozinha novamente, a mulher deixou que seus pensamentos a dominassem. Pensava em tudo que deixara para trás na Grand Line, em todos os sacrifícios que fizera por causa de uma única variável. Um único acontecimento que mudará sua vida — e que, apesar de tudo, ela nunca se arrependeria.
Ela havia amado. Amado profundamente. E esse amor lhe dera um presente: um filho. O filho de um homem que agora estava morto. Um homem por quem ela teria enfrentado o mundo... e talvez o tivesse enfrentado, se o destino tivesse sido mais gentil. Se ele não tivesse morrido, ela jamais teria deixado a Grand Line. Mas o passado não podia ser mudado. Agora, restava apenas seguir em frente. Por ela. E por ele.
Por seu filho.
Ela sabia que seu filho também correria perigo um dia. O mesmo perigo que tirou a vida de seu amado. Por isso, teria que prepará-lo. Ensinar-lhe tudo o que sabia. Para que ele sobrevivesse. Para que fosse forte.
Um raio especialmente poderoso caiu perto do navio, sacudindo tudo ao redor. O impacto, tanto da luz quanto do som, fez o navio se desviar do curso por alguns minutos. O timoneiro lutou contra o leme até conseguir estabilizar a embarcação e colocá-la de volta na rota.
— Tempestade... — murmurou a mulher, ainda olhando para o céu com serenidade. — Naruto... Naruto seria um bom nome.
Durante dois dias e três noites, a tempestade persistiu, como se o mar estivesse em guerra contra o próprio céu. Mas, no terceiro dia, finalmente, as nuvens se abriram e a luz ofuscante do sol brilhou no horizonte. O navio, após a longa tormenta, atracou em uma pequena ilha. Era apenas uma parada temporária — um ponto de reabastecimento para alimentos e água. A ilha era simples, com uma população de aproximadamente 250 habitantes.
Enquanto a tripulação descarregava mantimentos, o mesmo tripulante que antes havia tentado convencer a mulher a entrar no navio a viu descendo calmamente pela rampa, caminhando em direção à pequena vila portuária.
— Senhorita! — chamou ele. — Essa não é a parada final! Ainda vamos seguir para a Ilha Dawn, no Reino Goa!
— Não se preocupe comigo. — respondeu ela, com um sorriso triste. — Meu destino... sempre foi uma ilha como essa.
Sem esperar resposta, ela desapareceu entre os prédios simples da vila. O tripulante, confuso e ainda preocupado, apenas suspirou e deu de ombros antes de voltar ao trabalho. Mas, em sua mente, a pergunta persistia: por que uma mulher como ela escolheria um lugar tão... insignificante?
Enquanto isso, a mulher caminhava pelas ruas da vila, observando a vida simples e feliz das pessoas. Trabalhavam com o sorriso no rosto, cuidando de suas casas e ajudando uns aos outros como uma grande família. Era um tipo de felicidade que ela não via há muito tempo — e que desejava para seu filho.
Seguindo por uma trilha de terra, ela alcançou o limite da vila. À sua frente, uma densa floresta cobria grande parte da ilha. Sem hesitar, ela entrou.
Foram quase duas horas caminhando em silêncio pela mata, seguindo apenas seu instinto. Até que, enfim, encontrou o que procurava: uma clareira espaçosa no ponto mais alto da ilha, cercada por árvores altas e silenciosas.
— Aqui será um bom lugar. — murmurou, observando ao redor com atenção.
Movida pelo som do vento, seguiu por um pequeno trecho até alcançar um ponto onde podia ver toda a ilha — até mesmo o pequeno porto do outro lado. Era um lugar perfeito.
Ela respirou fundo, o sol agora banhando seu rosto. Um novo capítulo estava prestes a começar.
— Bem... nada será feito sozinho. Está na hora de pôr a mão na massa. — disse ela, determinada.
A clareira no topo da ilha estava silenciosa, cercada pelo som distante dos pássaros e pelo farfalhar das folhas ao vento. No centro da vegetação densa, a mulher de cabelos ruivos observava o local com olhos afiados, avaliando o terreno com precisão. Ela respirou fundo, sentindo o cheiro fresco da natureza selvagem.
Sem pressa, afastou o capuz do manto escuro que a cobria. Seus cabelos carmesins caíram livres sobre os ombros. Em seguida, desabotoou o manto, revelando o que carregava por baixo: presa em suas costas, uma katana de lâmina longa e fina, com bainha negra decorada com detalhes em vermelho escarlate. O cabo, envolto em tiras de couro vermelho e preto, denunciava a arma de uma guerreira experiente.
Então, com cortes precisos, mesmo à distância, ela girou a katana com um movimento circular poderoso, liberando uma rajada de vento afiada. Árvores ao redor da clareira começaram a tombar, cortadas com uma perfeição cirúrgica. Troncos se separaram em tábuas, vigas e colunas de sustentação como se tivessem sido serrados por mestres carpinteiros — e não por uma lâmina empunhada por uma mulher sozinha.
Pedaços de madeira voaram em várias direções, caindo ao redor dela como peças de um quebra-cabeça que ela mesma já sabia como montar. A terra tremeu levemente com os impactos, mas a mulher manteve-se imóvel, observando sua obra. O brilho afiado da katana foi recolhido de volta à bainha em um único movimento suave.
— "Isso vai economizar dias de trabalho..." — murmurou, com um leve sorriso no canto dos lábios.
Com os materiais prontos, ela começou a erguer sua morada. Não havia hesitação em seus movimentos. As vigas foram fincadas na terra como se fossem palitos de fósforo. As tábuas eram marteladas com precisão. Cada parede erguida com sincronia, como se ela já tivesse feito isso mil vezes antes.
O suor escorria pela testa enquanto o sol descia lentamente no céu. Mesmo assim, ela não parava. A cada batida, a cada encaixe, a clareira se transformava — deixava de ser um espaço abandonado e selvagem para se tornar um lar.
À medida que a noite caía, ela acendia uma fogueira improvisada no centro da cabana semi-pronta e descansava ao lado dela, com as mãos sujas de terra e serragem, mas o olhar sereno, quase em paz.
A mão repousava novamente sobre a barriga.
— "Você vai crescer num lugar seguro... e vai ser forte. Como o seu pai... e como eu."
Na manhã seguinte, ela terminou a estrutura do teto e reforçou as paredes com uma camada dupla de madeira. Também esculpiu uma pequena janela virada para o leste, para que a luz da manhã sempre fosse a primeira coisa a iluminar o interior da casa.
Era simples, mas sólida. Um abrigo digno.
Os meses passaram. A cabana estava pronta. Simples por fora, mas forte e bem estruturada. Por dentro, havia uma cama de palha com lençois limpos, uma pequena lareira feita com pedras empilhadas e várias ferramentas improvisadas penduradas nas paredes. Um verdadeiro refúgio.
Mas o tempo do nascimento se aproximava. O peso da barriga tornava seus movimentos mais lentos e suas noites mais inquietas.
Foi numa manhã ensolarada, enquanto colhia água perto do riacho, que sentiu uma contração forte e repentina.
— "Ah... já está na hora..." — disse entre os dentes, apertando o ventre com uma das mãos.
Com esforço, desceu a trilha de volta à vila. Suava frio. Cada passo era uma luta contra a dor crescente. Ao chegar, bateu na porta de uma pequena casa próxima ao campo de hortas.
A senhora que abriu a porta era baixa, de cabelos brancos e rosto enrugado, mas com olhos vivos e gentis.
— "Oh, querida... você está em trabalho de parto, não está?"
— "Sim... preciso de ajuda... agora."
— "Entre, rápido!"
A senhora — conhecida como Dona Mei, a parteira da vila — preparou o quarto de parto com uma rapidez que só a experiência permite. Ferveu água, limpou panos, acendeu ervas medicinais e orientou a ruiva a deitar-se na esteira preparada.
— "Respire fundo. Vamos passar por isso juntas, ouviu? Não lute contra a dor — vá com ela."
As horas se arrastaram em meio a gemidos e contrações. A mulher apertava os lençóis com tanta força que os dedos cravavam na madeira do chão. O suor escorria por sua testa, e seus cabelos molhados grudavam em seu rosto.
— "Você é forte. Está indo muito bem, mais um pouco!" — dizia Dona Mei com firmeza.
A ruiva mordia os lábios, sem gritar. Suportava tudo em silêncio, como uma guerreira no campo de batalha.
E então... um choro ecoou pelo quarto.
— "Ele nasceu! É um menino!"
Dona Mei o levantou com cuidado, limpando o bebê com panos mornos e envolvendo-o num cobertor de algodão. A mulher, com os olhos marejados, estendeu os braços com tremor.
O bebê foi colocado em seu colo. Tinha os cabelos loiros dourados, pele clara bronzeada e olhos fechados, ainda sensíveis à luz. Ela o abraçou com ternura e, pela primeira vez em muito tempo... sorriu de verdade.
— "Naruto... meu pequeno raio de sol."
Cenas de TransiçãoA luz âmbar do entardecer atravessava as janelas de madeira, pintando o interior da cabana com tons dourados. O chão ainda era de terra batida, coberto com peles secas e folhas trançadas. Kushina estava ajoelhada a alguns metros de Naruto, que balançava o corpinho de um lado para o outro, suas perninhas tremendo de esforço e curiosidade.
— "Vamos lá, Naruto..." — dizia ela com um tom suave, os braços estendidos à frente — "Só mais um passinho… você consegue!"
Naruto esticou uma mão gordinha, deu um passo... outro... e então caiu de bumbum com um baque leve. Ficou parado por um segundo, fazendo biquinho.
Kushina correu até ele antes que chorasse, pegando-o no colo com um riso caloroso.
— "Você quase conseguiu, meu amor! Meu guerreirinho logo vai sair correndo por aí me dando trabalho!"
Ela nem sabia o quanto isso era verdade.
Naruto sorriu com a bochecha encostada no ombro dela, balbuciando um som incompreensível. Kushina o apertou contra o peito, sentindo o coração aquecer. Pela primeira vez em muito tempo, ela se sentia em paz.
As Primeiras PalavrasAlguns meses depois, em uma tarde chuvosa, Kushina costurava uma manta sentada perto da lareira. Naruto, agora com quase dois anos, brincava com pedaços de madeira, tentando empilhá-los como torres.
Do nada, ele apontou para ela com olhos arregalados e disse com esforço:
— "Má...mã...mãe..."
Kushina parou de costurar, congelada. O tempo pareceu parar ao redor.
— "Você... você me chamou de 'mãe'?"
Ele deu um sorriso banguela e repetiu com orgulho:
— "Mamãe!"
Ela largou a manta e correu até ele, pegando-o no colo e girando no ar, rindo enquanto os olhos se enchiam de lágrimas.
— "Você é incrível, meu filho! Mamãe tá tão orgulhosa!"
A chuva batia suavemente nas janelas, enquanto o calor do fogo e o som do riso deles preenchiam a cabana.
Transição 3 – O Furacão CrescenteAos quatro anos, Naruto já era o terror dos arredores da floresta e da vila portuária. Os aldeões o conheciam como "aquele loirinho do mato", um menino que aparecia do nada e causava confusão com um sorriso encantador.
Cena 1: Naruto subia numa árvore tentando alcançar um ninho de passarinho.
— "Naruto, desce daí agora!" — gritava Kushina do chão.
— "Mas mãe, eu só quero ver se eles já voam!"
Cena 2: Ele entrava escondido na venda da vila e trocava as etiquetas de preço só para ver os adultos se confundirem.
Cena 3: Kushina corria atrás dele pela vila depois que ele soltara três cabras do curral de um vizinho.
Cena 4: Naruto pintava o rosto de um senhor dormindo na praça com carvão, rindo alto.
Cena 5: Ele construía um "navio pirata" usando pedaços da cerca de casa e tentou colocá-lo no lago.
— "Você destruiu minha cerca!" — esbravejou Kushina, com Naruto encolhido atrás de um barril.
Cena 6:
— "Naruto Uzumaki! O que você fez agora?!" — dizia Kushina, com a mão na cintura e a outra segurando uma galinha molhada.
— "Eu só queria que ela aprendesse a nadar, mãe!"
Ela não conseguia decidir entre rir ou gritar.
Apesar das traquinagens, cada noite terminava da mesma forma: Naruto enrolado em cobertas, com a cabeça no colo da mãe, enquanto ela penteava seus cabelos e contava histórias de terras distantes.
— "Um dia, eu vou conhecer tudo isso, né mãe?"
— "Vai sim, meu amor. Mas só depois de aprender a respeitar as galinhas dos outros." — dizia com um sorriso de lado, enquanto Naruto só bufava com aquilo.
Com o tempo, a pequena cabana que Kushina havia construído com as próprias mãos começou a crescer. Primeiro, uma varanda. Depois, um depósito para guardar comida e ferramentas. Quando Naruto fez cinco anos, ela ergueu um segundo andar — um feito que os moradores da vila observaram com espanto.
— "Aquela mulher... sozinha, levantou um andar inteiro em dois dias?" — cochichavam.
— "Ela não é normal. Aquela força... ninguém da vila conseguiria."
Kushina sorriu ao ouvir esses comentários — nunca respondia, mas se orgulhava. Fazia por ela, e fazia por Naruto.
A casa passou a ter janelas com cortinas costuradas à mão, móveis esculpidos em madeira escura e flores plantadas ao redor da estrutura. Um verdadeiro lar no coração da floresta.
O sol da manhã brilhava forte quando Naruto, agora com sete anos, surgiu no topo do telhado da casa de dois andares. Seus cabelos loiros espetados dançavam ao vento, e ele usava uma capa vermelha improvisada, amarrada ao pescoço com uma corda.
— "Olhem para mim! Eu sou o guardião da florestaaaaaa!" — gritou ele, abrindo os braços como se estivesse prestes a voar.
Kushina, com uma cesta de roupas nos braços, olhou para cima com um suspiro longo.
— "Naruto... se você quebrar outra telha, vai consertar sozinho!"
— "Relaxa, mãe! Eu calculei tudo!"
Ele se jogou do telhado direto para uma pilha de palha estrategicamente posicionada no chão. Um "POF!" seco, seguido por uma gargalhada alta.
Kushina caminhou até ele com as mãos na cintura, tentando conter um sorriso.
— "Você quer me dar um ataque do coração, é isso?"
— "Hehe... desculpa, mãe. Mas foi legal, né?"
Ela balançou a cabeça, vencida.
— "Você é impossível... Mas é meu impossível favorito."
Enquanto ela o levava pela mão de volta para dentro de casa, seus olhos se perderam por um momento no céu claro da manhã.
"Minato... nosso filho está crescendo."
A câmera imaginária se afastava, revelando a casa de madeira cercada por árvores densas, flores silvestres e uma pequena horta. O som do riso entre mãe e filho ecoava pela floresta como uma melodia breve, antes de desaparecer no verde profundo.
Dias depoisO céu ainda era dominado pela escuridão, mas uma tênue faixa azul-clara já começava a contornar o horizonte. Dentro de um quarto simples, com móveis de madeira e paredes decoradas com desenhos infantis, Naruto já estava desperto. Seus olhos estavam bem abertos, acesos por uma energia inquieta.
Vestiu suas roupas rapidamente: camisa escura, calças leves e resistentes, e uma faixa improvisada onde escondia bugigangas — sementes explosivas, pedras afiadas, e um gancho com corda que ele mesmo fabricou. Subiu no parapeito da janela com a confiança de um caçador noturno e sussurrou:
— "Hora de se divertir!"
Num salto, desapareceu no ar.
Seu corpo voou cerca de 35 metros, pousando com leveza na borda da floresta. Por um instante, ficou ali, em silêncio, ouvindo os sons da natureza. E então, correu. Não por medo. Mas porque hoje... era dia de fugir.
Desde que completara cinco anos, Naruto vivia um ciclo que poucos adultos aguentariam.
Kushina não era apenas sua mãe. Era também sua treinadora, sua carcereira... e seu teste diário de sobrevivência.
O treinamento começava antes do sol nascer, todos os dias, sem descanso. Cada sessão era desenhada para empurrar Naruto ao limite — e então, quebrar esse limite.
Primeiro Ano:Naruto começou com exercícios físicos que pareciam absurdos. Arrastar pedras do tamanho de carros por trilhas íngremes. Cavar buracos de dois metros de profundidade usando apenas as mãos. Ficar pendurado por horas em cordas molhadas, suspensas sobre poços de água gelada.
— "A força bruta não vem só dos músculos, Naruto", dizia Kushina. "Vem da sua resistência mental. Você precisa continuar quando tudo em você grita pra parar."
Ele fazia flexões com as mãos mergulhadas em brasas mornas (camufladas sob areia) para desenvolver tolerância à dor. Corria com pesos amarrados aos tornozelos enquanto precisava manter um copo cheio de água na cabeça — o equilíbrio era tão importante quanto a força.
Segundo Ano:Kushina intensificou. Além de repetir os treinos anteriores, ela introduziu combates diretos. Naruto enfrentava sua mãe com espadas de madeira, bastões, lanças improvisadas e até com armadilhas escondidas.
— "Lutar não é só bater, Naruto. É sobreviver. É pensar. É enganar. É prever."
Ela o colocava em provas mentais: ficar vendado no meio da floresta e encontrar o caminho de volta apenas ouvindo o som do vento. Outras vezes, ele era deixado em árvores altíssimas, com a missão de descer apenas usando cordas... e elas nunca estavam completas. Ele precisava improvisar.
Começaram os desafios sensoriais. Naruto tinha que lutar vendado contra sons falsos, fugir de armadilhas camufladas, e distinguir folhas venenosas das comestíveis com o olfato.
Ele aprendeu a resistir ao cansaço extremo meditando em posições desconfortáveis durante horas, sentindo as formigas morderem sua pele, o frio cortante das manhãs e o calor escaldante do meio-dia.
Se ele chorava, ela não o consolava. Se ele caía, ela dizia:
— "Levanta. Você ainda respira, então ainda pode lutar."
Naruto aprendeu a cair de trinta metros e rolar sem quebrar nada. Aprendeu a usar as árvores como aliadas — pulava de galho em galho como um predador. Quando sua mão sangrava, ele amarrava folhas. Quando sua perna doía, ele mancava até esquecer.
E assim, ele cresceu.
Não como um garoto comum. Mas como algo mais.
Seus socos agora rachavam troncos. Seus saltos pareciam de um animal selvagem. Sua respiração era controlada. Sua atenção, afiada. E mesmo assim... ele ainda acordava no escuro, tentando fugir da próxima sessão.
Mas algo dentro dele começava a entender. As palavras de Kushina ecoavam todas as noites:
— "Naruto... o mundo lá fora é cruel. Eu não vou deixar ele te destruir. Vou te preparar para destruí-lo se for preciso antes disso acontecer."
Agora, enquanto saltava alegremente entre os galhos da floresta, Naruto deixava tudo isso para trás — nem que fosse por um breve momento. Em 20 minutos, percorreu os 12 quilômetros até a vila portuária. Chegou ofegante, mas sorrindo
Andou até uma tenda de madeira onde um senhor vendia pães e quitutes. Naruto comprou um saquinho com pães de queijo, roscas temperadas e algumas frutas secas com as moedas que guardava secretamente. Comeu ali mesmo, sentado num telhado, observando a vila acordar.
Depois, decidiu voltar, ainda saboreando seu café da manhã. Saltava calmamente entre as copas, com a luz dourada do sol começando a se infiltrar entre as folhas... até que algo deu errado.
Do alto, um grito cortante de predador ecoou. Uma sombra monstruosa se jogou sobre ele — uma ave de rapina colossal, com asas de cinco metros e garras maiores que espadas.
Naruto mal teve tempo de gritar quando sentiu duas garras atravessarem seu braço esquerdo e sua lateral. A dor foi imediata, queimando como fogo. A criatura o agarrava no ar, tentando levá-lo para longe.
Mas ele não era um garoto comum.
Mesmo com a dor lancinante, Naruto ativou instintivamente um dos exercícios que Kushina ensinará Respirando fundo com todo o seu foco ele fez, Em frações de segundo, ele desacelerou os batimentos, forçou o corpo a responder sob estresse. Seus músculos tensionaram com precisão. Ele agarrou um dos dedos da garra e girou com força antinatural, estalando o osso do animal.
A criatura urrou e o soltou.
Caindo de uma altura de cem metros, Naruto não entrou em pânico. Seus olhos buscaram galhos, vinhas, qualquer ponto de contato. E então ele agiu — girou o corpo no ar para reduzir a velocidade da queda, começou a bater os pés no ar como nos treinos de salto, usando pequenas explosões musculares para mudar de direção no ar.
Agarrava galhos e usava o próprio impulso para saltar de novo, criando uma descida em zigue-zague. Os impactos eram brutais — cada um um teste de resistência física — mas ele suportava. Estava acostumado. Isso era só mais um dia sob o comando de Kushina Uzumaki.
Finalmente, caiu no chão com um baque. O impacto trincou o solo sob seus pés.
Seu corpo tremia. Mas ele se levantou.
"Maldito pássaro…" murmurou, com sangue escorrendo pelo rosto.
Ele rasgou o que restava da camisa e improvisou bandagens, controlando a respiração. A hemorragia diminuía. A dor, ele enterrava. O treinamento o ensinara: não lute contra a dor — use-a.
O rugido cortou os céus.
A águia monstruosa descia de novo, abrindo as asas como uma sombra da morte. As garras, ainda manchadas de sangue, miravam o peito do garoto. Mas Naruto estava preparado.
Ele cravou os pés no chão e ativou o que chamava de Impulso de Raiz: uma técnica inventada por ele durante os treinos, onde usava os músculos das pernas ao máximo, com total controle respiratório, para criar uma explosão de força a partir do solo. Saltou para o lado como um raio, deixando para trás uma cratera onde as garras se cravaram.
A águia girou, tentando acertá-lo com o bico. Naruto usou a técnica Deslize de Areia: um movimento corporal com o centro de gravidade baixíssimo, como havia aprendido se equilibrando em barris rolando ladeira abaixo. Escapou por centímetros. O golpe quebrou duas árvores atrás dele.
"Se eu correr… ela me pegar. Se eu parar… ela me mata."
Naruto cerrou os punhos e firmou os pés no chão. "Então só tem um jeito, eu destruo ela."
Saltou de novo, mas dessa vez, suas mãos se agarraram à casca de uma árvore gigante. Com um giro poderoso de quadril e ombros, lançou seu corpo como uma catapulta, girando no ar. As árvores tremiam quando seus pés as usavam como trampolins.
A criatura bateu as asas para interceptá-lo, mas Naruto se impulsionou para o alto em espiral — Salto Torpedo — uma técnica em que ele se transformava num giro contínuo para atravessar obstáculos.
A águia se virou no ar para agarrá-lo de frente, mas Naruto já estava no ar, pulando direto para sua cabeça.
Com um grito de raiva selvagem, ele ergueu o seu braço bom e socou com o seu punho o rosto da criatura com toda a sua força.
"AAAARRRGH!"
O impacto fez a cabeça da ave se virar violentamente para o lado enquanto metade de seu bico era quebrado pela força do soco de Naruto, que desequilibrando-a. E antes que ela pudesse recuperar o controle, Naruto agarrou ela.
Alcançou o dorso da criatura.
Ela se debatia. Ele cambaleou.
Mas logo firmou os pés. Correu pelas costas dela como se estivesse num campo de batalha, desviando das asas, se abaixando das penas que se mexiam como lanças. Usou os músculos do abdômen para se manter firme mesmo com o vento brutal.
Quando chegou ao pescoço da ave, fincou a estaca de madeira afiada que guardava desde a queda.
"AAARRRGHHHH!"
A criatura urrou, mas ele não parou. Empurrou mais fundo. Com os dentes cerrados e o corpo gritando por descanso, ele deu um último golpe com a estaca — cravando-a direto no cérebro da águia.
Ela despencou, levando Naruto junto.
O impacto da queda varreu uma clareira inteira. Naruto foi arremessado como uma folha. Rolou, bateu em pedras, e parou num tronco.
Ficou ali, imóvel.
Respiração lenta. Corpo dolorido. Sangue em tudo.
Mas... vivo.
O silêncio reinava, como se a floresta prestasse homenagem.
Naruto abriu os olhos. O sol nascia por entre os galhos, dourando seu rosto sujo. Ele sorriu.
"Eu… venci."
E então, exausto, perdeu a consciência.
O silêncio após a queda da águia foi quebrado por um sussurro entre as folhas — quase imperceptível, como o roçar do vento em um sonho esquecido. Mas naquela floresta selvagem, até os sussurros carregavam peso.
Naruto estava estirado ao lado do cadáver da criatura alada. Seu corpo coberto de feridas e sangue seco. O braço esquerdo improvisadamente enfaixado com o que restava de sua camisa, e o peito arfando, lento e doloroso. Exausto. Vulnerável.
Porém… ele não estava sozinho.
Do interior das sombras, dois olhos amarelados brilharam como brasas acesas. Um rugido grave, abafado, reverberou pela mata, como um trovão contido. Pés pesados pisavam o chão com calma... mas carregando o peso de um propósito.
Era um tigre.
Não uma fera comum — mas um monstro colossal. A pelagem era de um vermelho incandescente, com listras negras que pareciam cicatrizes esculpidas em brasa. As presas, curvas como ganchos de ossos, saltavam para fora da mandíbula. E suas garras arranhavam o solo com tal força que deixavam sulcos fundos por onde passava. Ele não era apenas um predador. Era o rei daquela floresta.
O cheiro de sangue e o som da luta tinham chamado sua atenção.
A criatura se aproximou do corpo da águia, farejando com curiosidade. A língua áspera passou pelo bico rachado, saboreando o gosto da batalha. Mas então... seu olhar pousou sobre o garoto.
Naruto recobrou a consciência ao sentir o bafo quente da fera sobre seu rosto. Tentou reagir. Seu corpo se moveu com lentidão. Dor em cada fibra. Mas seus instintos gritaram, como alarmes em desespero.
Quando abriu os olhos, viu presas. Viu saliva escorrendo. Viu a fome.
"Não... agora não...", murmurou, tentando mover-se. Mas seu corpo estava traindo sua vontade.
O tigre deu um passo à frente. Um rosnado baixo escapou de sua garganta. A floresta inteira pareceu prender o fôlego.
Naruto rastejou, com esforço, até o tronco de uma árvore. Tentou ficar de pé. Seus músculos tremiam. Seus ossos protestavam.
"Se eu cair aqui... minha mãe nunca vai saber o que aconteceu..."
Ele firmou os dentes. O medo queimava. Mas a determinação queimava mais.
Com os punhos cerrados, ergueu-se. Trêmulo. Quase desabando. Mas de pé.
"Se eu vou morrer... vou morrer de pé!"
O rugido do tigre rasgou o ar como um trovão. As árvores estremeceram. Pássaros fugiram em debandada.
O ataque veio como um raio.
Naruto cruzou os braços à frente do rosto e rolou para o lado no último instante. As garras passaram raspando, cortando seu ombro — a dor explodiu, mas ele resistiu ao grito.
No segundo seguinte, a fera girou o corpo para um novo ataque.
Naruto agarrou um galho grosso, largado ao lado da águia. Mal conseguia segurá-lo. Mas quando o tigre saltou novamente, ele girou o corpo com tudo, acertando o focinho da criatura com um estalo.
CRACK!
O tigre recuou. O sangue escorria do nariz. Mas o golpe só inflamou sua fúria.
Naruto caiu de joelhos. Tossiu sangue. Os olhos embaçados. O coração descompassado.
"Não vou... durar muito mais..."
O tigre se preparou para o golpe final.
Foi quando um som cortou o ar:
FIUUUUUUU!
E uma voz ecoou, carregada de fúria:
"AFASTE-SE DELE, MONSTRO!"
Uma pedra, do tamanho de uma cabeça humana, atingiu o tigre com força brutal, desequilibrando a criatura.
Do alto de uma árvore, uma figura desceu como um raio, impactando o solo ao lado de Naruto — folhas voaram em espiral. Era Kushina.
O olhar dela era fogo puro. Os cabelos dançavam como chamas vivas. E em sua mão, uma katana de lâmina vermelha e preta refletia o primeiro brilho dourado do amanhecer.
O tigre rugiu com ferocidade, saltando contra ela com selvageria. Mas encontrou algo mais feroz em seus olhos.
Kushina não recuou.
Ela girou o corpo com precisão perfeita, desviando da investida, e sua katana cortou o ar com um assobio.
SCHRRRAACK!
Uma das patas da fera foi arrancada no impacto. O tigre tombou, uivando de dor.
Kushina se posicionou à frente de Naruto, entre ele e a morte.
Sem hesitar, girou novamente, impulsionando-se como uma flecha. Com o ombro, acertou a lateral da criatura, lançando-a contra uma árvore espessa, que rachou com o impacto.
"VOCÊ O MACHUCOU!" gritou, a voz carregada da fúria de uma mãe.
O tigre tentou morder. Ela agachou-se e saltou para sua cabeça. Com as duas mãos, ergueu a katana e desceu com fúria entre os olhos da fera.
THRRRUUUM!
"Você... tocou no meu filho."
O ar pareceu congelar. Por um segundo, o tempo parou.
E então, ela avançou como um raio.
O tigre rugiu e tentou reagir — mas Kushina já estava atrás dele. Com a katana manchada de sangue, saltou e a cravou entre as escápulas da criatura, deslizando com ela até o chão, rasgando músculo e osso.
A fera uivou, mas ela saltou para longe antes que pudesse revidar.
Naruto, de joelhos, assistia boquiaberto. Sua mãe era um furacão encarnado.
O tigre, mesmo mutilado, lançou-se em um último ataque, patas prontas para esmagar, presas sedentas por carne.
Kushina não se mexeu até o último instante.
E então…
ZUUUM!
Desapareceu diante da criatura.
O golpe do tigre atingiu apenas o ar.
Quando ele ergueu o olhar...
Ela já estava atrás dele.
A katana empunhada. Silêncio total.
"Isso… é por tentar matar o meu filho."
E no seguinte instante o corpo do tigre congelou.
E então… uma linha de sangue se formou em seu pescoço. E em seguida, sua cabeça escorregou do corpo, caindo com um THUD pesado no chão coberto de folhas.
A besta tombou, com o corpo desabando ao lado do cadáver da águia gigante. O sangue das duas criaturas agora tingia a clareira como uma tinta escarlate de puro sangue.
Kushina respirou fundo, o olhar ainda fixo no cadáver da criatura. O sangue escorria pela lâmina, pingando lentamente no solo.
Ela puxou a espada de volta com um movimento limpo, girando-a no ar para dispersar o sangue, e a embainhou.
Naruto tentou dizer algo… mas sua voz falhou. Um sorriso cansado surgiu em seu rosto.
Sem perder tempo, correu até Naruto, que ainda tentava manter-se consciente. Seus olhos estavam semicerrados, e um sorriso cansado se formava em seu rosto.
"Você... veio..." ele sussurrou.
Kushina caiu de joelhos ao lado dele e o puxou para seus braços, com firmeza e cuidado. "Claro que vim, seu pestinha." Ela apertou os dentes, tentando conter as lágrimas.
Ele riu, mesmo com dor.
"Você… é a melhor mãe… e a mais assustadora…"
"O que você estava pensando fugindo sozinho assim?!"
Naruto, mesmo ferido, deixou escapar uma risada fraca. "Só... queria pão de queijo..."
Kushina soltou um suspiro entrecortado e apoiou a testa na dele. "Idiota... te amo, mas ainda vou te bater por isso."
Ela então o ergueu com facilidade nos braços. A força dela era tamanha que parecia carregar uma pena. Sem olhar para trás, partiu com velocidade pela floresta, pulando de árvore em árvore como um raio carmesim, levando seu filho de volta para casa.
E atrás dela… o cadáver do tigre vermelho e da águia jazia em silêncio. A floresta havia presenciado algo raro naquela manhã:
A fúria de uma mãe.
O sol já tocava o topo das árvores quando Kushina cruzou a porta de casa, suja de sangue, folhas e suor. Não se importava com nada além do filho. Levou-o direto ao quarto, deitou-o no futon e se ajoelhou ao lado, começando os primeiros cuidados.
Sem hesitar, limpou os ferimentos com água morna e infusões de ervas preparadas por ela mesma. Costurou cortes profundos com precisão cirúrgica, enquanto murmurava para si mesma — não feitiços, mas promessas de que ele ficaria bem. Por fim, enfaixou o abdômen e o braço com tiras de tecido limpas e firmes. Cada gesto era cuidadoso, quase ritualístico.
Naruto adormeceu pouco depois, vencido pela dor e pelo cansaço.
Mas foi quando o silêncio caiu sobre a casa… que algo começou a acontecer.
Nas primeiras horas da manhã seguinte, a luz fraca do amanhecer atravessava as cortinas, desenhando sombras no rosto de Naruto. Kushina ainda estava ali, sentada ao seu lado, braços cruzados e olhos atentos. Não dormira nem por um segundo.
Quando desenfaixou o braço e a barriga do garoto para checar os ferimentos, seus olhos se estreitaram.
As perfurações profundas… haviam quase desaparecido.
O que deveria levar semanas para cicatrizar estava quase fechado. Não havia inchaço, nem febre. A pele estava marcada, mas sem sangramento. A regeneração era rápida demais. Anormal demais.
Ela ficou em silêncio por longos segundos.
Não parecia surpresa.
Não mais.
Ela havia visto isso antes — em si mesma.
Apertou os punhos com força, os nós dos dedos ficando brancos.
"Aceleração celular absurda… resistência além do normal… e aquele brilho dourado nos olhos quando ele lutava…" murmurou em voz baixa, como se falasse mais para os espíritos do que para si.
Levantou-se lentamente e foi até a janela. A luz suave do sol matinal iluminou seu rosto cansado e sério.
"Você não é só um menino forte, Naruto. Você é meu filho… e o sangue que corre em nossas veias… pode tanto proteger quanto destruir."
Ela tocou o próprio peito, sentindo o peso do passado e do destino.
No fim da tarde, Naruto despertou. Bocejou longamente e esticou os braços com cuidado, sentindo o corpo ainda dolorido — mas, para seu espanto, muito melhor do que esperava.
Ao seu lado, um prato com arroz, peixe grelhado e chá fumegante.
"Wow… nem parece que quase morri ontem!" disse, com um sorriso bobo no rosto.
"É porque você quase não morreu," respondeu uma voz firme vinda da porta.
Kushina entrou no quarto, braços cruzados, o olhar penetrante. A presença dela encheu o ambiente de tensão, mas também de calor.
Naruto engoliu em seco.
Ela se aproximou lentamente, os olhos semicerrados.
"Você saiu escondido antes do amanhecer. Quase morreu. Me fez atravessar a floresta, lutar com uma fera lendária, te costurar inteira… e o que tem a dizer sobre isso?"
Naruto coçou a cabeça. "...O pão de queijo tava bom?"
Silêncio.
BAP!
Um leve tapa na testa. Nada doloroso, mas o suficiente para fazê-lo resmungar.
"Seu castigo vai ser simples: três dias sem sair de casa. Sem treinar. Sem floresta. Só descanso, chá… e trabalhos domésticos comigo. Reclama, eu dobro o tempo."
Naruto arregalou os olhos. "Isso é pior do que apanhar!"
"Então agradeça por ainda estar vivo pra reclamar," disse ela, se abaixando e arrumando o cabelo dele.
Naruto bufou, mas logo sorriu. "Tá bom, mãe."
Ela retribuiu o sorriso — mas seus olhos continuavam sérios. Porque ela sabia.
Aquele incidente foi um aviso.
Naruto não era apenas forte. Ele era diferente.
Ele era seu filho.
E o sangue deles…
Carregava algo antigo. Algo perigoso. Algo que, um dia, talvez não pudesse ser contido.
O vento soprava suave pela varanda da casa, acariciando as folhas das árvores com um sussurro tranquilo. O céu, limpo e azul, parecia abençoar o recomeço de Naruto. Era como se o mundo inteiro respirasse junto com ele — depois de dias de dor, castigo e descanso, finalmente chegava a hora de seguir em frente.
Durante os três dias de punição, Naruto havia seguido uma rotina simples. Nada de treinos. Nada de floresta. Apenas tarefas domésticas: varrer o chão, lavar louça, carregar baldes de água, cortar lenha sob a supervisão rígida de Kushina, e, claro, muitas broncas — embora algumas viessem com risos e outras com um leve puxão de orelha. Ele havia dormido cedo, se alimentado bem, e, pela primeira vez em muito tempo… sentiu-se normal. Quase como uma criança qualquer.
Mas ele não era uma criança qualquer.
No quarto dia, logo ao amanhecer, Kushina o chamou para os fundos da casa. O céu ainda exibia tons suaves de laranja e azul quando Naruto passou pela porta dos fundos e a viu: ali, sob a sombra de uma enorme árvore de copa larga e raízes profundas, ela o esperava. Estava de pé, braços cruzados, a expressão firme e tranquila como uma montanha.
Naruto se aproximou, ainda coçando a cabeça com os olhos semicerrados de sono e uma pontinha de confusão no rosto.
"Ei, mãe... por que você me fez ficar de castigo mesmo?" — perguntou com um meio sorriso, tentando aliviar o clima.
Kushina suspirou, os olhos suavizando apenas por um instante.
"Porque, Naruto… não foi só pelo risco que você correu, mas pela decisão inconsequente. Você ainda é uma criança, e não importa o quanto seu corpo se recupere rápido, seu coração ainda está crescendo. E eu… sou sua mãe." — sua voz era firme, mas com carinho.
Ela então se inclinou levemente e deu um leve peteleco na testa de Naruto, o suficiente para fazer o garoto dar um passo para trás.
"Auch! Isso doeu!" — reclamou, massageando a testa com uma careta — "Mas valeu a pena pelo pão de queijo."
Kushina balançou a cabeça, quase rindo, mas logo voltou ao tom sério.
"Agora, vamos falar de algo importante. Hoje você vai dar o próximo passo no seu treinamento. O que te ensinei até agora foi apenas o começo. Tudo aquilo — resistência, velocidade, força física — era pra transformar seu corpo em algo... incomum."
Naruto inclinou a cabeça. "Como assim, algo incomum?"
"Quero dizer que, comparado às pessoas normais, você já ultrapassou muitos limites. Mas neste mundo, Naruto... existem forças muito além do que os olhos humanos podem ver. Criaturas, poderes, batalhas que fariam qualquer pessoa comum tremer só de olhar. Se você quiser sobreviver, e mais do que isso, proteger o que ama... precisa conhecer essas forças."
Ela se aproximou e colocou uma mão firme sobre o ombro dele. Os olhos dela estavam sérios — e havia algo mais ali. Uma sombra de passado. De peso.
"Existem quatro formas de obter força neste mundo. E você precisa entender cada uma delas."
Naruto cruzou os braços, tentando parecer mais maduro, embora a curiosidade em seus olhos fosse impossível de esconder.
"Tá bom… pode falar. Quais são esses quatro jeitos?
"Antes de falar de raças ou poderes místicos, você precisa entender o valor do próprio corpo. O primeiro e mais antigo jeito de alguém se tornar poderoso neste mundo é o mais simples… e também o mais difícil."
Ela parou diante de um tronco grosso com marcas de cortes, socos e queimaduras antigas. Pegou um bastão de madeira, girando-o nos dedos com maestria, e olhou para Naruto.
"Treinar o corpo até os ossos gritarem. Repetir movimentos até a mente entrar em transe. Superar limites que a maioria chamaria de impossíveis. Isso transforma um corpo comum… em uma arma viva."
Naruto cruzou os braços, curioso.
"Mas o que dá pra fazer só com o corpo? Tipo, quebrar pedras?"
Kushina sorriu de canto.
"Naruto, existem pessoas neste mundo que racham montanhas com os punhos. Que usam katanas com tanta velocidade que conseguem cortar dezenas de inimigos em segundos. Guerreiros que lutam com as mãos nuas e derrubam monstros gigantes… Tudo isso sem poderes mágicos ou frutas estranhas."
"Tá, mas… como eles lutam? Tem tipos diferentes?"
"Sim. A força física extrema se divide em três caminhos principais, e alguns conseguem combinar os três. Vou te explicar."
Ela ergueu três dedos.
Primeiro: O Caminho da Força Bruta.
"Esses são os monstros do mundo físico. Eles não usam técnicas refinadas. Usam seus punhos, pernas, ombros, até a cabeça como armas. Lutam esmagando o oponente com força absurda. Costumam usar marretas, clavas ou até lutar com as mãos nuas. Cada golpe é como uma explosão. Eles suportam golpes diretos que matariam outras pessoas. Mas seu maior ponto forte é o impacto."
Naruto arregalou os olhos.
"Tipo aquele soco que você deu na parede da cozinha quando ficou brava comigo?"
Kushina corou levemente e olhou para o lado.
"…Sim, tipo aquilo."
Segundo: O Caminho das Armas.
"Esse é o caminho de quem transforma um simples pedaço de ferro em uma extensão do próprio corpo. Os maiores espadachins, arqueiros, lanceiros… todos treinam com tanta intensidade que as armas se tornam parte deles. Um espadachim verdadeiro pode cortar aço com uma katana comum. Mas, para isso… precisa treinar centenas de milhares de vezes o mesmo corte. De olhos abertos e fechados. Na chuva, no escuro, até o próprio corpo agir sozinho."
Naruto piscou, empolgado.
"E dá pra usar uma espada gigante? Tipo assim, ó!" — ele gesticulou com os braços abertos, exagerando no tamanho.
Kushina riu.
"Se você for forte o bastante… até uma árvore serve de espada."
E o terceiro: O Caminho dos Estilos de Luta.
"Aqui entra a arte, o controle e a disciplina. Lutadores que treinam artes marciais até o corpo responder antes da mente. Esses guerreiros sabem onde atingir, como derrubar, como desviar. Eles transformam até os movimentos do inimigo em fraquezas. Cada passo, cada giro, cada respiração… é parte da luta. Eles conseguem vencer inimigos maiores apenas com técnica."
Naruto coçou o queixo, intrigado.
"Então tem gente que treina até saber tudo isso… só pra usar o corpo mesmo?"
"Sim. E os maiores mestres… são temidos até mesmo por usuários de Akuma no Mi."
Ela rapidamente cortou a pergunta que seu filho iria fazer, dizendo:
"Explicarei isso depois."
Ela se aproximou, abaixando-se ao nível dos olhos do filho.
"Esse é o caminho mais demorado, mas também o mais confiável. Nada pode ser tirado de você. Nenhum poder pode ser selado. Nenhuma fraqueza te impede de lutar. Quando seu próprio corpo é sua arma… você nunca estará desarmado."
Naruto fechou os punhos, sentindo uma chama crescendo dentro do peito.
"Então é esse o caminho que você me ensinou até agora, né? Aqueles treinos todos… o peso, os socos, correr carregando pedra nas costas…"
Kushina assentiu.
"Sim. E você aguentou mais do que qualquer criança normal. Naruto, seu corpo está se tornando uma fortaleza. Mas agora… você vai começar a aprender como usá-lo de verdade."
"Eu vou aprender a lutar?"
"Vai aprender a destruir ou proteger, Naruto. A diferença está em qual escolha você faz com o poder que vai ter."
Naruto ficou em silêncio por um momento… então sorriu com confiança.
"Então me ensina tudo, mãe! Eu quero ser forte. Forte de verdade! Como você!"
Kushina sorriu… mas em seus olhos ainda havia um leve traço de medo.
Não medo do que ele poderia se tornar…
Mas do que poderia despertar um dia.
No dia seguinte, Kushina acordou Naruto mais cedo que o normal. O céu ainda estava em tons de laranja e violeta, e o ar tinha o cheiro fresco do orvalho. Ela o guiou até o alto de uma colina atrás da casa, onde o vento era mais forte e a vista se abria para uma imensidão de árvores e céu.
Ali, sentaram-se sobre a grama, e Kushina segurou um pequeno caderno de couro antigo nas mãos, com desenhos estranhos na capa.
"Agora, Naruto… hoje você vai aprender sobre o segundo método de alcançar poder: as Akuma no Mi."
Naruto ergueu uma sobrancelha, curioso.
"Akuma… o quê?"
"Akuma no Mi," repetiu ela com firmeza. "Traduzido, significa Frutas do Diabo. São frutas mágicas, amaldiçoadas, que existem no mundo desde antes da história registrada. Quem come uma delas ganha um poder… mas paga um preço."
Ela abriu o caderno, revelando desenhos de frutas de formas esquisitas, cada uma com padrões espirais, texturas únicas e formatos bizarros.
"Essas frutas são divididas em três grandes categorias, e todas elas concedem poderes incríveis. Mas, em troca, quem come uma perde a capacidade de nadar. O mar… se torna seu inimigo mortal."
Naruto fez uma careta.
"Eu não amo nada na água, e perder a capacidade de nadar? Pra sempre? É tipo… muito ruim mesmo?"
"Sim. Você afunda como uma pedra no mar. E o mar tira toda sua força. Você não consegue usar seus poderes na água. É o preço da maldição."
"Ugh… então se um cara que come isso cair num rio, ele morre?"
"Se não for salvo, sim."
Ela virou a página, mostrando os três tipos de Akuma no Mi.
"Agora escute com atenção. As frutas são divididas em três tipos principais: Paramecia, Zoan e Logia."
Naruto se deitou de barriga para cima, olhando o céu, enquanto escutava com atenção.
"Primeira Paramecia – Esse tipo transforma o corpo em algo especial. Essas frutas concedem poderes variados. Podem transformar o corpo em ferro, permitir controlar argila, gerar explosões, virar veneno… As possibilidades são infinitas. Paramecia é a categoria mais comum. Pode alterar o corpo, o ambiente, ou dar algum tipo de habilidade especial."
Naruto rolou de lado, curioso.
"E qual foi a fruta mais estranha que você já viu?" — perguntou Naruto, com os olhos brilhando de curiosidade.
Kushina sorriu de leve, levando um dedo ao queixo enquanto relembrava.
"Hmmm… Uma vez eu vi um homem que comeu uma fruta que permitia transformar qualquer som que ele ouvisse em projéteis invisíveis."
Naruto piscou, confuso.
"Como assim?"
"Se alguém gritasse perto dele, ele podia agarrar aquele som, moldá-lo como se fosse uma flecha ou uma lança invisível e atirar com força absurda. Era como ser atingido por algo que você nem vê chegando."
Naruto ficou boquiaberto.
"Nossa... e tinha alguma fraqueza?"
Kushina fez uma expressão pensativa.
"Sim... o silêncio. Se ninguém fizesse barulho, ele não podia usar o poder. Ele vivia desesperado por som. Já vi ele até provocar batalhas só pra gerar ruído e continuar lutando."
Naruto balançou a cabeça, impressionado.
"Tem cada fruta esquisita nesse mundo..."
Kushina riu.
"E você ainda vai conhecer muitas, meu filho, segundo tipo Zoan – O corpo se torna animal.
"Quem come uma fruta Zoan pode se transformar em um animal. Existem três formas: forma humana, forma híbrida e forma animal total. Um Zoan pode virar um leão, um falcão, um touro… e os mais raros viram criaturas mitológicas, como fênix ou dragões."
Ela mostrou uma ilustração de um homem com asas de águia e garras afiadas.
"Zoans aumentam força física e instintos. São perfeitos pra combate corpo a corpo. E cada um tem a ferocidade do animal que representa."
"Será que tem uma Zoan de… raposa? Ou de lobo?" Naruto perguntou, animado.
"Provavelmente tem, sim. Mas quanto mais rara a espécie… mais difícil achar a fruta."
Logia – O corpo se torna elemento.
"Logia são os mais perigosos. Quem come uma fruta Logia pode virar um elemento da natureza: fogo, areia, relâmpago, fumaça, gelo… Eles podem se tornar intangíveis. Armas passam direto por eles. Eles podem se regenerar com facilidade, voar, destruir cidades."
Ela parou, olhando Naruto com seriedade.
"Eles são… deuses ambulantes. Mas mesmo eles têm fraquezas, se você souber onde acertar."
Naruto piscou, impressionado.
"Então tem gente que vira… fogo? Tipo, literalmente?"
"Sim. E lutar contra alguém assim sem saber como atingi-lo… é suicídio."
Ele ficou em silêncio por um tempo, processando tudo. Depois, perguntou:
"Então… qualquer um pode comer uma dessas frutas?"
"Sim. Mas só uma. Quem tenta comer duas… morre. O corpo explode. O poder das Akuma no Mi é forte demais pra ser contido por um corpo normal."
Naruto franziu o cenho.
"E como alguém acha uma fruta dessas?"
"Elas aparecem de tempos em tempos. Em mercados negros, em ilhas distantes, às vezes até flutuando no mar. Quando um usuário morre, o poder da fruta renasce… em outra fruta comum próxima. É como se o espírito do poder procurasse um novo recipiente."
Naruto olhou pro caderno com um brilho nos olhos.
"E você… já comeu uma?"
Kushina desviou o olhar por um momento, depois sorriu de lado.
"Essa é uma resposta pra outro dia."
Naruto ficou emburrado.
"Você sempre faz isso!"
"É pra você se concentrar no agora. Por enquanto, você não precisa de uma Akuma no Mi pra ser forte. Mas… se algum dia encontrar uma… precisará decidir se vale ou não o preço."
Ele assentiu, sério dessa vez.
"Tá. Mas se eu comer uma… vou escolher uma que tenha a ver comigo. Tipo, algo veloz. Ou algo que me ajude a proteger os outros. Nada de brinquedo esquisito."
Kushina sorriu, orgulhosa.
"Boa escolha, garoto. Mas lembra disso: o poder não faz o homem. É o homem que define o que fazer com o poder."
Já era o fim da tarde quando Naruto e Kushina voltaram da colina. Mas, mesmo com o jantar servido, Naruto ainda estava pilhado pelas informações do dia.
Depois de devorar três tigelas de arroz com carne, ele correu até a sala e se jogou no tatame, ofegante.
"Tá! Já sei do treino físico… já sei das Akuma no Mi… e agora você disse que tinha mais um jeito. Esse é o terceiro, né?"
Kushina se sentou ao lado dele, cruzando as pernas.
"Isso mesmo. Agora é hora de você aprender sobre os seres que nascem fortes… as raças especiais."
Naruto ergueu as sobrancelhas.
"Nascer forte?! Tipo, já nascer quebrando pedra?!"
Ela riu.
"Alguns sim. Outros… são ainda mais perigosos que isso."
Seu olhar ficou sério.
"Naruto, nem todos os seres humanos são iguais. E, na verdade, nem todos os que parecem humanos… são realmente humanos."
Ela se levantou, pegando um livro antigo da estante, com páginas grossas e envelhecidas. Abriu numa ilustração que mostrava várias silhuetas humanoides, cada uma com traços diferentes: caudas, presas, asas, guelras, pelos.
"Existem raças que nascem com habilidades naturais. Eles não precisam comer uma Akuma no Mi, nem treinar até o limite. A força já está no sangue deles."
Naruto olhava fascinado.
"Que tipo de raças são essas?"
"Vamos por partes." Ela virou a página.
"Homens-Peixe e Sereianos, Esses vivem nos oceanos. Têm guelras, respiração aquática e uma força física dez vezes maior que a de um humano comum, mesmo fora d'água. Eles controlam a água com técnicas próprias chamadas karatê dos homens-peixe."
Naruto ficou pasmo.
"Dez vezes?! Imagina o soco desses caras!"
"Agora os Minks são humanoides com características animais. Existem minks felinos, caninos, répteis, aves… Todos eles possuem um poder chamado Eletricidade Natural, uma energia que corre pelo corpo deles como se fosse parte de seus músculos."
Ela apontou para um desenho de um homem-coelho com eletricidade nas pernas.
"E o mais impressionante: em noites de lua cheia… eles entram no modo Sulong, uma transformação que eleva tudo — velocidade, força, instintos. É praticamente impossível pará-los assim."
Naruto arregalou os olhos.
"Tipo lobisomem elétrico!?"
Kushina sorriu. "Exatamente.
"Existem também os Gigantes. Habitantes de ilhas distantes, com corpos que alcançam até vinte metros de altura. Desde crianças, eles destroem árvores só com o peso do passo."
"E tem algum desses aqui por perto?" — perguntou Naruto.
"Não. Vivem em terras distantes e isoladas… e não se misturam fácil com outras raças."
Kushina então fechou o livro. O tom dela mudou.
"Mas, Naruto… nem todas as raças são conhecidas. Algumas… são secretas. Escondidas. Porque o que corre no sangue delas é muito poderoso. E temido por aqueles que se sentem ameaçados por esse poder."
Naruto a encarou, tentando decifrar o que ela queria dizer.
"E eu? Eu sou… humano, né?"
Ela ficou em silêncio por alguns segundos. Depois respirou fundo.
"Sim… mas nem totalmente."
Ele se levantou num pulo.
"COMO ASSIM?!"
"Você… e eu… carregamos uma linhagem diferente. É algo que poucas pessoas conhecem. E não é uma raça comum como as outras. É antiga. Quase extinta. E por isso… eu sempre fui tão rígida com seu treino."
Naruto olhava com os olhos arregalados, o coração batendo acelerado.
"Mas que raça é essa? Qual é o nome? O que ela faz?"
Kushina colocou a mão no ombro dele, firme, mas com carinho.
"Tudo a seu tempo. Você ainda não está pronto pra saber. Mas escute bem: esse sangue que você carrega pode ser uma dádiva para nós… mas uma maldição para aqueles que querem usá-lo para seus próprios fins — ou erradicá-lo por medo do que representa."
Naruto cerrou os punhos, os olhos brilhando com um misto de raiva e determinação.
"Então que eles tentem… Se esse poder é meu, eu vou usá-lo do meu jeito. E ninguém vai me impedir."
Kushina sorriu de leve. Pela primeira vez, vendo ali não só seu filho… mas um verdadeiro guerreiro em formação.
O céu já estava escuro quando Kushina e Naruto foram para o quintal, onde a luz da lua iluminava o chão de terra batida. Kushina acendeu uma tocha presa em um dos postes de madeira, criando uma aura quente ao redor dos dois.
Naruto se sentou sobre os calcanhares, olhos atentos. Ele já parecia mais maduro só de ouvir tudo aquilo — o mundo era muito maior do que ele imaginava.
"Certo… agora falta o último. O quarto jeito de ficar forte. O tal do… Haki, né?"
Kushina cruzou os braços, observando o filho com um ar mais sério.
"Sim. O Haki. Talvez… o mais perigoso de todos. Não porque destrói o corpo, mas porque desperta o que está escondido dentro da alma."
Naruto engoliu seco.
"Tá… isso foi meio assustador."
Ela se ajoelhou à frente dele, aproximando os rostos.
"Haki, Naruto… é a manifestação pura da vontade de uma pessoa."
Ela apontou para o peito de Naruto.
"Todo ser vivo tem uma centelha dentro de si. Algo que grita para sobreviver, para vencer, para proteger. O Haki é essa centelha transformada em poder."
Ela então começou a explicar com calma, em tom firme:
"Kenbunshoku no Haki — o Haki da Observação. Esse é o Haki dos sentidos. Quem desperta ele consegue sentir a presença, as intenções, e até as emoções dos outros. Pode até prever movimentos em batalha se estiver bem treinado."
Naruto arregalou os olhos.
"Prever movimentos?! Tipo… esquivar antes da pessoa bater!?"
"Exatamente. Guerreiros que dominam esse Haki são quase impossíveis de atingir. Eles conseguem lutar até de olhos fechados."
Ela fez uma pausa e continuou:
"Busoshoku no Haki — o Haki do Armamento. Esse Haki permite revestir o corpo com uma força invisível, como uma armadura. Pode ser concentrado nas mãos, pés, armas… e, com treinamento, endurece como se fosse ferro negro."
Naruto se levantou empolgado, levantando os punhos.
"Então tipo… soco de ferro?! Isso é muito maneiro!"
Kushina então estreitou os olhos, ficando mais séria.
"Mais do que maneiro… esse tipo de Haki é essencial. Principalmente contra usuários de Akuma no Mi."
Naruto piscou, confuso.
"Como assim?"
Ela se levantou e andou lentamente pelo quintal.
"Usuários de Akuma no Mi ganham poderes incríveis, mas perdem algo em troca… o mar os rejeita. E além disso, muitos se tornam arrogantes. Confiam tanto nos seus poderes que esquecem o que é uma luta justa."
Ela voltou o olhar para ele.
"O Haki do Armamento ignora esses poderes. Ele atravessa as defesas que as Akuma no Mi oferecem. Por mais poderosa que seja uma fruta… se o oponente dominar o Haki, ele pode feri-los como se fossem pessoas comuns."
Naruto ficou surpreso.
"Então… o Haki é tipo… a fraqueza natural das frutas?"
"Exato. É por isso que quem tem uma Akuma no Mi precisa ainda mais de Haki. E quem não tem, pode usar o Haki como arma principal."
Ela se virou para a lua e continuou:
"E o último… é o mais raro. O Haoshoku no Haki — o Haki do Conquistador. Também chamado de Haki do Rei."
Naruto inclinou a cabeça.
"Tem rei no nome? Ele manda nos outros?"
Kushina balançou a cabeça.
"Não é sobre mandar. É sobre impor sua vontade. Esse Haki não pode ser aprendido. Ou você nasce com ele… ou não. Só os que nasceram para liderar, para guiar… ou para destruir o mundo, têm esse poder."
Naruto ficou mudo por um tempo, processando aquilo.
"E você… tem esse Haki, mãe?"
Ela hesitou por longos segundos antes de responder:
"Sim."
Naruto arregalou os olhos.
"Eu não sabia isso sobre você…"
Kushina se aproximou e se ajoelhou na frente dele.
"Naruto, se você treinar bem… poderá dominar todos os tipos de Haki. Mas o mais importante é isso: Haki é a extensão da sua alma. Se seu coração for fraco, sua vontade também será… e, como consequência, seu Haki será mais fraco do que poderia ser com uma vontade forte. E então… você perderá tudo."
Ele respirou fundo, sentindo o peso daquelas palavras.
"Então eu nunca vou deixar meu coração ficar fraco. Eu prometo, mãe. Um dia, eu vou dominar tudo isso. Haki, espada, porrada… o que for."
Ela o puxou num abraço apertado.
"Só não esqueça quem você é nesse caminho."
Fim de capítulo
