Há não muito tempo...
Dizem que o primeiro amor nunca se esquece. Bom, com toda certeza nunca esqueci o meu. Há algum tempo, não me lembro direito... Tudo bem, foi há cinco anos quando ainda estava no fundamentaleu conheci um garoto. O nome dele?
Hitsugaya Toushirou.
Bonito, né?
Mas vamos ao que interessa. Foi na quarta série, a melhor época da minha vida, tirando o fato que estudei separada da minha irmã. Yuzu e eu não dividimos pela primeira vez a mesma sala em anos e curiosamente um mês depois do inicio do ano letivo um aluno se transferiu. Ele logo chamou atenção da classe ao se apresentar. Também, como não chamaria? Os cabelos brancos e desalinhados. A expressão séria e osolhos verdes penetrantes. Mesmo que fossebaixo, meia dúzia de meninas ficou louquinha por ele.
Eu não. Apenas pensava no quanto era constrangedor ser alvo de tantos olhares curiosos. Desde esse momento ele me chamou atenção. Assisti o garoto depois da apresentação se acomodar na única carteira vaga.
A última perto da janela...
...Bem longede mim.
Pensavam ao contrário, não é? Mas não foi bem assim. Na verdade, eu e Toushirou demoramos um tempinho para nos aproximar.
Conforme as semanas foram passando, eu notei que seu comportamento era diferente dos demais garotos. Toushirou era isolado, só falava o necessário e mantinha um olhar penetrante para quem cometesse a burrice de encará-lo. Como se houvesse um muro que ninguém mais enxergava e ele fazia questão de deixar claro. Isso intimidava muita gente. Até os senpais tinham um certo receio em cobrir essa distância apesar de respeitarem.
Nas aulas de Educação Física, contudo, ele realmente me embasbacou. Sabem a expressão"de queixo caído"?Era assim que ficava quem assistisse um jogo dele. Era de se esperar que alguém tão solitário ficaria deslocado nessas aulas, mas não poderia estar mais enganada.
Em toda aula que o professor exigia que a turma praticasse um esporte coletivo, geralmente os mais conhecidos como vôlei ou basquete, Toushirou raramente participava, mas quando entrava em jogo... Ninguém ganhava do time dele de tão bem que jogava, provando que não precisava ser amigável para interagir com os outros. Entretanto, a verdadeira surpresa veioquando usávamos o campo pra praticar futebol.
Seus dribles perfeitos, os passes que pegava... O ataque dele era rápido demais, o outro time de futebol ficava esmagado. E o garoto era um aluno do fundamental! Obvio que meu queixo caía toda vez que via uma partida. Logo o clube o recrutou e como eu fazia parte do feminino de vez em quando a gente se encontrava na prática. Graças ao meu gosto por jogar com os garotos (queria melhorar meu desempenho) sempre invadia os treinos do time masculino, sempre participava de um jogo.
Podia-se dizer que fomos parceiros. Quase rivais. Mas éramos crianças e a diversão no esporte era o que me importava. Foi através do futebol que nos tornamos amigos. Eu não ficava o tempo todo o cobrindo de gracinhas e mesmo que mantivesse o olhar apático quase sempre pra mim, sentia que gostava da minha companhia até... Aquele dia.
Festival Esportivo, Colégio Fundamental Seiji.
- IKE, TOUSHIROU!
A platéia vibrava nas arquibancadas. Era o último jogo e estávamos na frente. Eu sei que era uma diferença de dois gols, mas mesmo assim... O time da sala 4-C era forte demais. Mordi o lábio. Por que Toushirou não faz nada?! Ele era o artilheiro caramba! Nervosa, vi outra vez o zagueiro dando um "carrinho" nele. Toushirou pulou desviando, mas perdeu a bola. Isso me estressou. Tremendo, me levantei do banco possessa.
- O QUE VOCÊ TÁ FAZENDO BAKA?! SE PERDER A BOLA DE NOVO EU VOU TE ESPANCAR!
Toushirou parou no mesmo instante de correr e levantou o rostome encarando do gramado. O espanto dele foi que me mortificou, me alertando do silêncio repentino em minha de crianças olhavam pra mim como se eu fosse uma maluca e nunca fiquei com tanta vergonha na vida!
Antes que fizesse uma besteira, tipo, correr dali e me esconder no primeiro lugar que encontrasse, Toushirou tirou seu olhar de mim voltando a correr. Por um instante, achei... que estivesse sorrindo. Mal o choque do meu grito passou e o povo arfava da arrancada dele. Quando fizeram o passe, à 2 metros do nosso gol, Toushirou entrou na frente roubando a bola e avançando. Três foram pra cima dele, nosso time o acompanhando no ataque. Numa finta ele driblou um garoto, passando a bola por cima de sua cabeça e depois só ouvi o grito explosivo da platéia. O árbitro anunciando o gol.
Naquelessegundos, vi o tempo correr devagar e minhas forças faltaram. Antes de marcar, Toushirou olhou sobre ombro bem na minha direção num ar convencido e moveu os lábios num perfeito "baka". A bola havia sido chutada pra ele e sem olhar jogou a perna mandando pro gol.
Caí sentada sem ar, sentindo meus olhos maiores de choque. Ele... fez o que entendi? Marcou um gol pra mim me chamando de idiota? Garoto convencido,mas... por que meu coração não para de bater disparado? É normal se sentir assim? Deve ser, nunca meu irmão fez isso quando ia assistir seus jogos e Toushirou é meu amigo. Então deve ser normal.
Depois que os jogos acabaram os senpais desmontaram as barracas, montando a fogueira enquanto que Toushirou e eu fugimos. Subimos para o terraço do nosso prédio e sentamos perto da grade. Aqui soprava um vento bom. Refrescava nesse tempo morno de verão e além disso, com o dia acabando o céu ficava lindo se enchendode estrelas, pintado nesse tom dourado e rosa misturando aos poucos no azul profundo. Era muito raro de se ver algo assim na cidade.
Nesse momento de pazesilêncio, ouvindo as pessoas lá embaixo nem lembrava mais o que aconteceu cedo quando de repente o garoto ao meu ladosuspirou.
- Karin... Você é realmente estranha.
- Há?
- Precisava gritar daquele jeito no meio do jogo?
Tudo pra esquecer aquele fiasco. Estremeci constrangida com a lembrança vergonhosa.
- Já pedi desculpas, não dá pra deixar pra lá?
Ele teve a coragem de bufar divertido e senti mais uma vez a sensação mortificante, eu quero apagar aquele mico da memória!
- Duvido que alguém vá esquecer, eu com certeza não vou.
Pisquei com seu tom, sua voz não soou brincalhonano final, foi diferente... O que esse garoto quis dizer com isso?Espiei desconfiadana sua direção, mas Toushirou continuava observando todo mundo dançar ao redor da fogueira num ar calmo. Bom, de qualquer modo isso não me incomodava ombros ao beber um gole da caixinha de suco enquanto olhava o céu. Estava mais brilhante com o crepúsculo cedendo.
- É incrível, não é?
Hum? O céu? De tão concentrada quase perdi outrosuspiro profundo ao meu lado.
- Meio ano já passou desde que cheguei. Não achei que ia me acostumar aqui.
Ah... É sobre isso que ele tá falando.
- Verdade, você disse que tinha se mudado, não é?
Toushirou me falou uma vez depois de um dia de treino que não morava em Karakura. Ele veio de Okinawa com sua família.
- Sim. Logo o festival vai acabar e as férias começarão daqui a uma semana. Alguém me disse que sou péssimo em fazer amigos, mas agora tem essa pessoa que insistiu tanto que me acostumei com ela.
Cuspi o suco.
- Nani?
Quase me engasguei de susto! Limpando a boca, o encarei pra ter certeza. Ele tinha acabado de falarsobre nossa amizade? Tombando a cabeça para trás Toushirou admirava o céu, longe daquelaexpressão taciturna que mantinha desde entrou no colégio. Isso me pegou desprevenida. Nunca o tinha visto assim. Era diferente demais!
- Quem é você?
Minha pergunta só o fez curvar os lábios divertido. Sorrindotorto, Toushirou desviou o olhar para mim focando toda sua atenção nos meus olhos. Num instante, esqueci de respirar prendendo o fôlego sem querer. Meu peito se apertou enquanto todo o sangue corriaparameu rosto. Os olhos verdes geralmente demonstravam frieza e apatia e agora estavam escuros e risonhos. Como se... Se dissessem alguma coisa.
- Não sou frio, Karin. Às vezes posso dizer que gostoda minha melhor amiga, sabia? Mesmo que ela brigue comigo no meio de um jogo.
Suspirei irritada saindo do transe. Ele realmente não vai deixar passar, né? Odeio quando ele dá uma de sabichão.
- Hai. Hai. A pressão de ser o artilheiro do time de futebol é demais até para o prodígio Hitsugaya, imagine ele com uma amiga encrenqueira?
Ele quase riu e desviei o olhar. Droga, o que foi aquilo? Meu coração ainda estava martelando. Toushirou não é de fazer essas coisas.
- E você?
- Eu?
Confusa,o olhei de novo franzindo o cenho. Ele havia abaixado a cabeça, olhando suaspernas cruzadas em lótus. Não consegui ver seus olhos, as mechas os cobriram.
- Mesmo que esteja no fundamental, é fácil saber que tem futuro como jogadora.
Sorri com isso. Ele é um dos poucos que acreditava em mim.
- Não é? Até a formatura vou esfregar na cara desses bakas. E daí que a gente perdeu o interescolar? Eu só estou começando. Quando me formar vou me inscrever para o colegial de Karakura.
Ergui a caixinha de suco como uma taça. Pouco me importava se ele riria de mim ou daria outra frase de sabedoria. Ninguém ia me tirar isso!
- Sabe, Karin.
- Sim?
Abaixei a caixinha o olhando e esperei. Toushirou continuava de cabeça baixa, isso me fez estranhar. Do outro lado do terraço, ouvi o rangido da porta de acesso se abrindo dando passagem pra uma turma, masnão prestei atenção. Bem no instante que ia perguntar o que ele queria sua boca se mexeu eos fogos de artifício estouraram. Não ouvi nada, o barulho abafou o sussurro, mas consegui ler seus lábios.
Minha mente congelou, meu rosto queimou forte em brasa. Só voltei a mim quando senti um toque no ombro, mal o vendo ficar de pé.
- Até depois.
Toushirou me deu um tapinha e se afastou seguindo até a porta de acesso. Sentada no lugar pensei no que disse, alheia as cores vibrantes explodirem no céu e percebique finalmenteentrava naquele mundo, cruzando a linha que senti quando o vi pela primeira vez.
Ele não me disse nada demais. Foi tão bobo e simples, mas ainda sim fazia uma diferença tão enorme que não conseguia pensar direito, muito menos desacelerar meucoração.
"Quando for se inscrever para esse colégio... Irei com você."
Encarando minhas mãos no colo, com todas essas sensaçõesfinalmente aceitei o que eu ignorava desde aquele primeiro dia. Me apaixonei pela primeira veze foi pelo meu amigo.
Depois disso na segunda-feira, nada foi como antes. Não porqueeu estava consciente dos meus sentimentos por ele, mas porque Toushirou quebrou meu coração de uma forma cruel e inesquecível para uma garota de 10 anos.
