Treino dos Clubes Esportivos - Pousada
KARIN POV
Depois daquela sensação constrangedora, afinalToushirou sabia muito bem o que aconteceu, elese manteve quieto encarando o celular mais uma vez, enquanto que eu respondia as perguntas do motorista o caminho todo. Quando o mesmocessou sua curiosidade observei a paisagem. Anoitecia e aos poucos a cidade se iluminava. O trajeto até a montanha seguia uma ponte acima de um canal saindo da cidade. À luz dos postes dava para ver o canteiro florido e gramado. Pena que acabou rápido. Assim que saímos da ponte entramos numa avenida e na rotatória, o motorista seguiu na direção de uma estrada sinuosa margeada de árvores. Foi uma mudança brusca dos prédios e concreto.
Estava tão concentrada na paisagem monótona – havia nada a se ver além de mato – quando de repente paramos.
- Chegamos. Pousada Tono.
Hã? Me inclinei no vão dos bancos da frente e não vi nada. Tudo o que os faróis iluminavam era um grande portal em verde com uma placa de madeira balançando ao vento.
Li os dizeres e realmente estávamos no lugar certo. Isso é muito esquisito. Toushirou saiu do táxi e o imitei pegando sua mochila de treino, jáque ele não lembrou pegar. Assim que fiquei de pé uma queimação pulsou da minha perna. Mordi o lábio. Agora não, por favor. Faltava pouco pra cair numa cama ou tomar um banho morno. O que pudesse relaxar essa bendita agonia.
Dei uma olhada discreta em Toushirou enquanto ele pegava minha mala com o motorista. Acertava a corrida e nem me incomodei em ajudar com o dinheiro. Não tinha algum comigo mesmo. Na volta às férias devolvo, isso se me lembrar. Caminhei até a entrada vendo uma estradinha de terra e pedregulhos serpenteando.
Onde ficava a tal pousada?
- Boa estadia.
Girei os calcanhares em tempo de ver o taxista acenar e deu a ré, manobrando o carro de volta. Tive um mal pressentimento.
- Pra onde ele vai?
As luzes traseiras e vermelhas sumiramladeira abaixo nas curvas sinuosas.
- Daqui pra frente teremos de caminhar.
Virei subitamente para a voz. Toushirou ajustava a alça da minha mala no ombro encarando a frente, enquanto sentia minha espinha gelar. Caminhei nervosa até seu lado. Não, não, não. Isso era alguma piada.
- Er... Achei que tivesse dito que a pousada ficava na base dessa montanha.
Sorri sem graça. Por favor, seja isso. No entanto, ele apenas iniciou a caminhada sem nem me olhar.
- E é. Essa trilha leva direto até lá.
O gosto da bile subiu forte na minha garganta. Olhei adiante mal vendo o caminho no meio desse escuro e o mato. Uma vertigem me atingiu quando me dei conta da situação. Daqui nem uma nesga de luz se via da casa! Quanto tempo vai demorar até a gente chegar lá? Dei uma espiada em Toushirou. Ele andava tranqüilo como se minha mala não pesasse nada, sem me esperar diga-se de passagem.
Respirei fundo e segui atrás. Conforme subíamos, o vento noturno soprava arrepiando minhas pernas e sacudindo os galhos. Fazia um farfalhar relaxante. Sorte que usava o moletom do meu irmão. Observei de relance Toushirou vendo-o normal. Ele ignorava esse frio, esse tédio e a mim. Teria me sentido mal, mas estava preocupada com outra coisa. Eu não sei se consigo subir esse caminho todo. Encarando as pedrinhas soltas no chão, mordi o lábio.
O que eu faço? Minhas restrições eram sérias e já quebrei mais da metade hoje. Apertando os punhos das mangas largas e longas do meu moletom levantei o rosto. Pela distância eu diria uns 500m. Nesse compasso lento, levaríamos acho que uns 45min ou uma hora. De qualquer modo, é uma subida em terreno irregular. Minha perna já fisgava com o excesso de ácido láctico, sentia a tíbia latejar constante e pra piorar não tomei meu remédio de novo.
- Parece preocupada.
Virei o rosto no susto encontrando Toushirou me olhando de viés, por um momento havia me esquecido dele e me desconcertei com esse ar sério em seus olhos. Desviei o olhar fingindo ajeitar a alça da sua mochila.
- Não é nada. Sabe por que o técnico escolheu esse lugar?
Se ele notou minha voz trêmula não falou. Seus passos chegaram mais perto de mim e tentei relaxar. Ainda era desconcertante pra mim o ter tão perto e "amigável" outra vez.
- Além de nos matar de correr num campo com ar rarefeito, têm umas termas por perto.
- Sério?
Toushirou assentiu olhando em frente.
- Águas medicinais acho, mas com certezaele apenas quer se divertir com a namorada.
Arregalei os olhos, entendendo nas entrelinhas a insinuação. Meu rosto ficava quente e ele me fitou bem nesse instante. Tinha uma expressãodebochadaalém do ar de riso. Só me deixou mais envergonhada e curiosa.
- Quem...?
- Unohana-sensei.
Dessa vez meu queixo caiu. Toushirou riu abafado do meu choque, mas poxa. A médica da escola namorando o bruto Zaraki Kenpachi?O homem é um demônio. Agora faz mais sentido ela ter vindo para esse acampamento.
- Ela é louca.
Sacudi a cabeça em descrença.
- Talvez. Mas quem sabe assim Zaraki não transforme esse acampamento num inferno.
Agora não entendi nada. O olhei e como se notasse, Toushirou me encarou assim que viramos numa curva.
- Ele fez os outros subirem correndo morro acima com a bagagem mais cedo.
o que Toushirou fez foi arquear as sobrancelhas com meu espanto e me controlei. Ok, nosso técnico é um demônio. E como o cidadão ao meu lado soube disso?
- Hiyori me mandou uma imagem pelo whats.
Ele lê pensamentos? Remexi incomodada de novo a alça de sua mochila desviando o olhar.
- Eu não perguntei nada.
- Eu sei.
Seu tom foi monótono, mas senti uma leve irritação. Ele queria bater papo comigo? Ou seria mais provável meu jeito defensivo perto dele? Bom, Toushirou é esperto pro meu desgosto. Deve ter percebido o quanto me incomoda. Se bem que... Não escondi muito lá no ônibus. Como o tópico da conversa se encerrou, continuamos em silêncio e inacreditavelmente não havia aquela tensão.
- Você é bem teimosa.
Pisquei com seu tom exasperado, mas fiquei quieta. O que quis dizer com isso? Dei uma olhadinha e me surpreendiao notar seu queixo cerrado, os olhos estreitados. Ele realmente estava frustrado, mas com o que? Não me dei ao luxo de entender sobre isso, tinha um problema bem mais todas as forças pra não mancar em sua frente e minha perna pesava. Se falasse, minha voz arfante me denunciaria.
Porém, enquanto andávamos não vi direito o caminho pelo escuro e pisei numa pedra. Meu pé escorregou deslizando, causando mais stress no músculo e guinchei tanto de susto como de dor. Antes que perdesse o equilíbrio, um braço me enlaçou rápido na cintura me segurando. Agarrei-o tremendo da cabeça aos pés quando me puxou contra seu corpo.
- Tudo bem?
Assenti assustada, achei que ia torcer o tornozelo. Tenteime endireitar e não consegui. Em pânico, mal pisei com o pé direito e senti o tendão protestar. Mais que essa sensação queimando na minha perna me deixando nauseada, meu peito se apertava não me soltou como seria o normal, mas também não disse nada. Meu corpo tremiaem nervosismo, nessa mínima distância dava pra verque eu transpirava.
- Eu...
Engoli em seco e tentei mais uma vez apenas para a dor aumentar. Prendi um gemido doloroso arquejando esegurando o bolo na garganta. Sem que eu pedisse, minhas narinas arderam e meus olhos se borravam d'água. Essa não, vou chorar. Eu nunca choro, somente nesses momentos e agora ele seria testemunha disso. Suspirando alto Toushirou me trouxe mais pra junto de si me espantando.
- Vamos sair da trilha.
Ele me virou de lado enquanto se abaixava. Meu coração errou o compassoquando seu braço escorregou atrás dos meus joelhos e se levantou, me tirando do chão. O abracei no pescoço por reflexo, o encarando surpresa. Toushirou me carregava nos braços! A noçãodisso enquanto ele andava até uma margem desse caminho fez a umidade nos meus olhos transbordar.
Mas espere um pouco.
- Você tácarregando minha mala!
- E?
Pisquei com me espiou num ar convencido e contra vontade minhas bochechas queimaram. Graças a Deus que estava quase um breu.
- Eeu sou pesada. Vai acabar nos derrubando.
Ele quase riu ao entrar no bosque sem deixar de me fitar. Como se fosse possível fiquei mais sem graça.
- Carrego mais peso do que você pensa. Além disso, Kurosaki, eu sou um homem.
Virei a cara. Ego masculino, eu mereço.
Pela visão periférica o vi segurar um sorriso ao me descer na grama perto de uma árvore. Ele nem me deixou ficar de pé, foi se abaixando até me sentar contra o tronco. Seu perfume que eu ignorava me deixou zonza com a proximidade. Ele é cheiroso, impossível não reparar. Além disso, o calor do seu corpo me manteve quentinha nesses instantes. A falta foi evidente quando se afastou tirando a alça da minha mala do pescoço.
- Não tem sinal aqui, então é impossível avisar alguém.
Peguei o meu celular do bolso e gemi ao ver sem uma única barra da torre.
- E agora?
- Esperamos até você melhorar.
A realidade me atingiu. Tão cedo isso não vai acontecer. Uma luz iluminou forte nesse escuro. Levei o olhar e me entalei ao ver Toushirou abrindo minha mala olhando tudo o que tinha dentro.
- Ei, o que você táfazendo?
Me inclinei pra frente, mas o tranco de dor me impediu de me mexer.
- Você trouxe um creme?
Hã? A náusea do vazio no estômago misturou com a confusão da sua pergunta.
- Creme?
- Gel ou algo do tipo.
Pra que ele pediu isso? Empertigada assisti ele remexer minhas coisas, concentrado e procurando. Como segurava o celular no alto vi claramente um pedaço de renda em cima do bolo de roupa e todo o ar foi arrancado dos meus pulmões. Minha calcinha!
- Isso é...?
Ele a olhou por um momento segurando. Quase enfartei.
- Larga agora!
Tentei tirar da sua mão, mas não consegui dobrar a perna. Droga. Toushirou apenas levantou os olhos me fitando e não sei se fiquei pálida ou enrubescia feito um tomate. Baixando o celular eletombou o rosto para frente e meio que sorriu. Seus olhos tinham um ar que agitou meu pulso. Era insinuante, até risonho, mas cheio de malicia.
- Você usa umas coisas bem ousadas.
Filho da p...! Estufei o peito de raiva abafando a vergonha e ao ver ele girou a peça de renda pela alça num dedo me provocando.
- Olha aqui seu...
- Desde quando sua tendinite ataca?
Perdi o fôlego e a bravata com a climade brincadeira se dissipou deixando-o sério e tenso. Num outro giro, Toushirou jogou a lingerie na mala me olhando e esperando, mas o tempo parou pra mim. Eu não conseguia respirar, nem raciocinar. De todas as pessoas, por que justo ele?
KARIN POF
HITSUGAYA POV
- Desde quando sua tendinite ataca?
Tudo o que recebi foi um silêncio tenso e atordoado.
Eu devia ter perguntado? Acho que não. Se fosse para ver essa garota me olhar tão assombrada assim, devia ter continuado calado. Kurosaki parecia acuada. Nem havia sombra da irritação por causa da peça intima. Eu não faço esse tipo de coisa, mas queria descontrair antes de entrarnesse assunto. Ficou óbvio pra mim que ela não aguentava dar sequer mais um passo. Não custava pedir ajuda.
Num fio de voz ela finalmente me respondeu estremecendo. Isso me incomodou.
- Como?
- Comoeu percebi?
Engolindo em seco ela assentiu e me sentei na grama. Ventava forte aqui, mas as copas das árvores não deixavam ver se o céu estava nublado. Espero que não. Nem estávamos na metade do caminho. Kurosaki esperava quase sufocada e resolvi ser direto
- No começoeu achei que você não tinha resistência. Nunca te vi correr uma volta inteira na educação física.
Seus olhos aumentaram e curvei os lábios compreensivo e divertido. Ela parecia bem fofa frágil assim.
- Minha sala fica no prédio ao lado da quadra de atletismo.
- Ah.
Baixando o olhar ela juntou as mãos quase enterradas nas mangas desse moletom largo junto ao peito, atraindo minha atenção. Os óculos escorregaram no nariz pequeno e mesmo com os tremores ela nem de longe se parecia com a bruxa – como os outros a chamam -, da nossa gerente. A diferença foi chocante.
Pisquei desviando o olhar. Não era hora pra isso e pigarreei retomando o assunto.
- Apenas tive certeza durante a viagem. Sua perna...
- Para.
Mirei Kurosaki com o tom urgente e desesperado. Ela fungava piscando rápido, afastando as lágrimas me causando um mal estar.
- Não... diga mais nada, ta bom?
- Tudo bem.
Era um tema delicado pra ela. Obvio que não tinha superado. Fechei o zíper da mala e abri um dos bolsos laterais. Achei o que queria e tratei de fechar também. Devia me sentir constrangido em remexer as coisas dela, mas não foi assim. Foi natural como se fosse com a minha namorada. Se bem que com Riruka não teria ousado. Esquisito.
Com a bisnaga do creme na mão, me movi ficando diante dela afastando a mala do caminho. Suspirei me preparando ao ataque que viria e escorreguei a mão debaixo do seu joelho direito. Ela deu pulo enrijecendo.
- Itai! Mas o que...?
- Está pior do que pensei.
Kurosaki arfou gemendo mais agudo enquanto eu dobrava sua perna devagar. Os tremores pioraram além dela se agitar.
- Para!Para, por favor!
- Quieta, senão demorará ainda mais.
Droga, ela não relaxa. Levantei os olhos encontrando os seus dolorosos.
- Vou te fazer uma massagem. O antiinflamatório não vai resolver depois de ter forçado tanto assim. O que fez desde cedo?
Como se fosse possível Kurosaki se chocou ainda mais, afinal falei sério.
- Eu corri.
Flexionei sua perna mais um pouco até a ver prendendo o fôlego. Além de transpirar sua pele estava quente. Sacudi a cabeça, pulsando o tendão quando encontrei.
- Foi imprudente. Está inflamado demais. Deve ser crônica ou o músculo não estaria inchado desse jeito.
- Você é médico?
Sorri do sarcasmo dela. Pegando um pouco do creme espalhei nas mãos.
- Vivo com um.
Escorregando uma mão na panturrilha, subi a palma apertando até o joelho. Kurosaki deu pulo, mas ignorei. Seria dolorido. Repeti o processo, alternando os movimentos. Às vezes chegava até o calcanhar e continuava, notando os gemidos abafados e sofridos, além de algo que eu não devia. Uma linha curva ao longo da panturrilha, outra mais discreta no fim da coxa e mais três cruzando a parte interna do joelho subindo na patela. Cicatrizes. Quase não tinham relevo.
Foi uma... não, duas cirurgias no mínimo. E todas são antigas. A curiosidade aumentou, mas não comentarei com ela. Já era muito que Kurosaki deixasse eu fazer isso. Apenas para confirmar a espiei vendo-acom o rosto para o outro lado, abafando com um punho a boca. Acho que o mordia, não dava pra culpar. Outra pessoa teria gritado. Continuei a massagem até sentiro tendão e os músculos relaxarem. Agora só falta gelo.
Assim que me afastei,ela puxou as pernas se encolhendosem dizer nada. Esperei-a dizer algo, mas continuou calada. Isso me incomodou.
- De nada.
Guardei o creme dentro da mala um pouco frustrado. Agora minhas mãos tinham um cheiro doce de baunilha. Nada contra, mas a ingratidão estava me dando nos nervos.
- Não conte a ninguém.
A olhei com o sussurro. Kurosaki parecia mais quietaque o normal.
- Claro que não. – tive uma idéia e sorri – É um segredo nosso.
Ela levantou a cabeça, espantada e rubra. Bem melhor. Antes que dissesse algo peguei sua mão e a puxei ao mesmo tempo que me virava de costas. Ela soltou um gritinho, quando a ajeitei nelas e cruzei as mãos embaixo dela. Seria melhor segurar suas coxas, mas Kurosaki já tem receio de mim.
- O que está fazendo? Me solta.
- Te carregar é o melhor. Além disso, não consegue andar, certo?
Olhei sobre o ombro quando me levantei. Ela apertava os lábios numa linha tensa e quis rir. Era bem teimosa, mas não burra. Rápido se segurou nos meus ombros mantendo distância.
- Se contar pra alguém...
Quase ri.
- Acha que vai manchar sua imagem se souberem?
Os olhos negros estreitaram de raiva por trás dos óculos. Também sei ser sarcástico.
- Eu não quero problemas com a presidente. Aquela garota já me odeia.
Hum... Ela deve ter ouvido falar do que aconteceu na festa. Voltei o olhar pra frente, me afastando da árvore onde estavam nossas coisas.
- Só para esclarecer, Hinamori e eu não temos nada.
- Diga isso pra ela.
Já tentei, mas cometi a burrada ontem. Desviando de umas raízes saímos na trilha larga de terra. Kurosaki não disse mais nada e eu também. Enquanto a levava pensei na estranheza disso e não me incomodava nenhum um pouco.
- Por que a gente nunca conversouantes?
- O que?
O corpo nas minhas costas enrijeceu e suspirei.
- Nada.
Pensei alto demais e suspirei resignado. Sentia falta de diálogo sem reservas. Ela é normal, não preciso ficar cuidando em como agir para não haver mal entendidos. Deve ser por isso. Sem contar que ela não está interessada em mim. O pensamento me divertiu. Segurei o sorriso a ajeitando nas costas e Kurosaki chiou nervosa. Continuamos em silêncio até que numa longa curva uma casa de campo se erguia. Todas as janelas nos andares estavam iluminadas e vi num pavimento dois ônibus prateados estacionados. Invés de ficar tenso, me animei com a idéia. Andei mais rápido entrando no estacionamento, cruzando as quadras de basquete e subi as escadas da varanda.
O saguão da pousada estava praticamente vazio. Ótimo. Deviam estar todos no refeitório. Cruzei rápido pelo comprido carpete verde até a recepção. A moça de uniforme se espantou ao nos ver, dando a volta no balcão.
- O que houve?São os alunos do colégio Karakura? – anuímos concordando e a mulhersuspirou frustrada -O treinador de vocês está nervoso desde que chegaram e não estavam nos ônibus.
Kurosaki gemeu e intervim.
- Já sabemos. Onde estão todos?
- Jantando no restaurante. Vou avisar...
- Não é preciso.
Se possível quero evitar a fúria de Zaraki até amanhã. A recepcionistapiscou confusa, mas assentiu. Voltando para o balcão, digitou no computador e depois de uns segundos nos entregou duas placas pequenas. Kurosaki pegou-as e nesse momento percebi que a mulher nos olhava curiosa. Ela reparava em como estávamos a vontade um com outro. Quase dava pra ver o que pensava e segurei um sorriso.
- Er... são os números dos seus quartos.
- Tem uma enfermaria por aqui?
Perguntei eela saiu do devaneio.
- Claro. Final daquele corredor, segunda porta à esquerda. Aconteceu alguma coisa?
Finalmente ela perguntou e Kurosaki se agitou desconfortável. Óbvio.
- Nada. Só uma entorse boba. Vamos, Toushirou.
O tapinha que me deu no ombro foi nervoso. Entendi o recado. Sorri simpático para a mulher e segui até o corredor que ela indicou. Assim que nos afastamos de suas vistas, as mãos nos ombrostremeram nervosas.
- Toushirou...
- Eu sei.
Devem ter ligado em todos os hotéis da cidade.
- Zaraki vai nos matar.
Não tiro sua razão. Encontrei a enfermaria e por sorte a porta de rolar estava aberta. O ambiente em branco e o cheiro de estéril preenchia o cômodo. Me dirigi até uma das duas macas cobertas de lençol amarelado e me virei sentando Kurosaki devagar. A falta de peso e calor me deu uma estranheza, mas ignorei ao me virar pra ela.
Kurosaki se ajeitava melhor encarando a perna direita fazendo um esgar e olhei também. A panturrilha tinha um tom avermelhado e estava distendida.
- Vou pegar gelo, assim vai desincharaté amanhã.
Mal me virei e senti um puxão leve na manga. A olhei esperando e curioso. Um tom rosado subiu no seu rosto e tentei não sorrir.
- Você não precisa fazer isso. – engoliu em seco hesitando – Tem que pegar nossas coisas que deixou pra trás.
Mas o quê? Quase ri frustrado com essa atitude durona dela, até o fim quer manter a dignidade, não é?Essa garota... Me inclinei um pouco para frente e debochado.
- Claro. Depois mando deixar no seu quarto.
Como se fosse possível foi mais vermelha. Soltou minha manga ligeiro e bufou.
- Olha aqui, eu... Você é um idiota.
Curvei os lábios convencido estreitando o olhar ao me virar pra saída.
- E você é orgulhosa demais. Até daqui a pouco, Kurosaki.
Saí do cômodo para o corredor numa sensação estranha, aliviada até. Frustrações a parte, não foi tão ruim passar esse tempo involuntário com ela. Kurosaki tinha um jeito e personalidade refrescantes pra mim depois de tanta timidez e agressividade das garotas. Meu celular vibrava no bolso há cada sinal de mensagem vinda, mas nem verifiquei. Apesar da irritação que senti, Kurosaki era interessante mesmo.
HITSUGAYA POF
No dia seguinte.
KARIN POV
No primeiro sinal do despertador, me levantei grogue e mal humorada. Meu futon estava tão quentinho, mas segundo a grade de programação tinha que estar de pé às4h00min. Zaraki é um demônio. Catei minha mini nécessaire e peguei uma toalha. O banheiro com certeza estava vazio. Saí do quarto e caminhei no corredor até o final. Eu não o dividia com ninguém e também dividiram em andares os clubes.
O segundo era da equipe das torcidas e o terceiro do futebol. Ontem a noite eu ouvi um abre e fecha de portas além de risadinhas abafadas. Claro, ninguém tentou entrar no meu quarto. Sou tão sociável.
No banheiro, fui até a bancada enorme de mármore branco e me encarei no espelho. Minha cara inchada de sono e os cabelos uma bagunça me cumprimentaram e suspirei. Eu realmente detesto o técnico. Se eu que dormi estou assim, imagine os outros com a farra às escondidas de ontem?
Bem, vou me divertir hoje. Pelo ao menos não serei a única a sofrer no treino. Lavei o rosto e escovei os dentes sem pressa e depois prendi o cabelo no alto com um coque. Minha franja caiu fofa com umas mechas ao redor do meu rosto e até que ficou bonito. Vou deixar assim depois que pentear.
Fui até um dos boxes e tirei o pijama colocando num dos cestos na estante e abri o chuveiro. Assim que a água caiu dei um pulo.
- Que frio...
Tiritando me ensaboei rápido e esfreguei com a esponja novinha. Meu banho não durou nem vinte minutos. Me enrolei na toalha assim que acabei e voltei pro quarto me trocar. Dei apenas uma escovada nos cabelos e prendi no mesmo coque que fiz no banheiro.
Pra hoje, coloquei uma saia por cima de uma legue e uma blusa de mangas compridas debaixo do moletom. Não estava sujo, lavei ontem assim que minha perna melhorou e... Me deixarem no quarto. Pondo os óculos pensei nisso. Quando um funcionário me deixou aqui, já tinham trazido minha mala. Eu não vi Toushirou desde que trouxe a bolsa de gelo pra mim.
Ele apenas me entregou e saiu. Isso me encabulou. Ora, depois daquela atenção toda e agir daquele jeito, claro que estranhei sua indiferença, se bem que devia ter esperado. Não fiz questão de querer sua companhia e tinha deixado claro pra ele. Ao sair do quarto peguei meu caderno e uma caneta. Não era hora de pensar nisso. O que aconteceu ontem foi... só um acaso, não vamos conversar ou ter aquela intimidade de amigos.
Me repeti isso ao descer, andar por andar de escada – aqui não tinha elevador – e saí no térreo em direção à área externa. Detrás da casa havia um quadra coberta, onde provavelmente a torcida iria treinar e paralelamente uma piscina natural de fonte termais conjuntas. Uma passarela de madeira e junco servia de intersecção. Apesar do ar nevoento e úmido luzes penduradas nas pilastras de tronco davam um ar relaxante.
Estremeci de frio caminhando por ela até o final. Onde seria o treino de hoje, tomara que Zaraki não tenha madrugado. Desci os degraus saindo da passarela e fui até as grandes que rodeavam o campo de futebol. As luzes dos postes estavam acesas e vi já uns cones e escadas de cordas espalhadas na grama. Eram para aquecimento, corridas e toques de bola seriam depois.
- Dez minutos atrasada nanica.
Dei um pulo de susto e me virei. Sorrindo sarcástico pra mim, Zaraki me encarava com um brilho assassino nos olhos.
- T..treinador.
- Onde é que estava ontem? Tive que cuidar sozinho desses molengas.
Engoli em seco, mas me empertiguei. Seu sorriso só ficou mais duro.
- O ônibus saiu sem mim, tive que pegar carona.
- Sei.
Suspirei com a tensão me subindo.
- É verdade. Se não acredita problema seu.
Ops. Ele estremeceu e vi que se pudesse me faria engolir o que disse.
- Cuide dessa língua, Kurosaki ou um dia vai perde-la.
Confesso que gelei por dentro e ele percebeu. Retomando a pose de superior foi logo despachando ordens.
- Vá pegar coletes de reservas no deposito do ginásio e todas as bolas de futebol. Depois pegue uns isotônicos...
- Onde vou arranjar isso?
Não vi uma maquina de bebidas no saguão e o refeitório. Esse cara apenas deu um sorriso sarcástico.
- Se vire. Acorde aquelas maricas depois que cuidar disso.
Ok. Isso era tarefa quase impossível. Como farei isso? Talvez se eu pegar uma...
- O QUE TÁ ESPERANDO?!
Pulei de susto com o grito
- Já tou indo!
Tratei de fazer o mais rápido que seria os coletes e as bolas de futebol. Corri pro ginásio, sentindo uma fisgadinha no tendão, mas dava pra agüentar e tive uma grande sorte. Um funcionário da pousada limpava o local e pedi muito educada que me fizesse esse favor. Ele sorriu simpático pra mim e concordou. Acho que o meu penteado deu sorte. Me deu um ar coquete. Catei um cronometro de umas caixas da estante de ferro que havia lá e encontrei o que usaria pra acordar os garotos. Uma corneta de torcida e se bemme lembro tinha um som irritante.
Peguei-a também segurando um sorriso. Até que não seria um trabalho impossível. Aqueles idiotas me pagariam por me deixar pra trás. Saí do deposito girando a corneta entre os dedos.
